quarta-feira, 23 de outubro de 2013

FIBROMIALGIA: QUANDO A DOR MUSCULAR É MAIS FORTE

FIBROMIALGIA

FIGURA 01: Localizações de dor mais características na fibromialgia. Disponívl em: http://amiceclinica.com.br/?p=256.

Condição crônica, não neuromuscular que se caracteriza basicamente por dor difusa, concentrada em pontos específicos bilaterais (tender points), sensação de fadiga e deturpação da qualidade do sono.  Incide principalmente em pessoas entre 35 e 60 anos, expressivamente mais em mulheres 9:1, com prevalência variando entre 2 a 11,5%. Não é comum em adolescentes, mas quando ocorre (frequência de 1,2 a 6,2% da população), em 71% dos casos há acometimento também da mãe.

A etiologia é desconhecida, embora haja teorias acerca do assunto. Sabe-se que o problema culmina numa hipersensibilidade a estímulos periféricos, tais como calor, pressão e corrente elétrica, sendo interpretados pelo sistema nervoso como sinais nociceptivos (dor). Fatores emocionais têm sido abordados como desencadeadores, assim como amplificadores das sensações dolorosas. Outra informação já conclusa é diminuição dos níveis de serotonina no soro e no LCR, além da diminuição da epinefrina no LCR e no aumento de substância P (subst. proteolítica) em 300 a 400% além do normal. Essas modificações ocorrerão onde os primeiros agem como inibidores da dor e o último como desencadeador. A diminuição do fluxo cerebral em áreas envolvidas na modulação da dor, tais como o núcleo caudado, o núcleo pontinho e o tálamo parece estar envolvida, mas ainda de forma indefinida.

Estudos já comprovaram que indivíduos portadores de fibromialgia (FBM) não possuem distúrbios na fibra muscular, apesar da manifestação evidente nela. As diversas teorias citadas tentam buscar algumas explicações para o problema, tais como a de que a fibromialgia seja resultado de distúrbios endócrinos envolvendo o hormônio tireoidiano e na secreção de hormônio do crescimento. O Sono se apresenta de difícil início, fácil interrupção, difícil de ser retomado, agitado, de despertar precoce e por isso não provedor de sensação restauradora. Ele é modificado por conta de alterações na secreção de serotonina e da substância proteolítica. O aumento no tônus simpático promove contração mantida de músculos com consequente redução de oxigenação e isquemia, o que aumenta a sensibilidade à dor nas áreas envolvidas.

Microtraumas vasculares aliados a uma predisposição genética de recolhimento de cálcio em excesso nas células aquém do ideal aumenta a contração muscular e diminui a oxigenação, assim como o mecanismo anterior. A diferença é que essa teoria adiciona uma diminuição da capacidade das mitocôndrias em gerar ATP, o que produz a fadiga. Traumas maiores como no chicote cervical também estão envolvidos no desencadeamento da fibromialgia.

Como os sintomas de hiperventilação reproduzem com semelhança os sintomas da fibromialgia, teoriza-se que possa ser resultado também de uma diminuição basal dos níveis de dióxido de carbono e consequentemente de ácidos sanguíneos. Isso é comprovado através da resposta positiva de alguns pacientes após a reeducação respiratória. Dentre outros sinais produzidos da FBM estão os tender points, que são pontos de contração muscular espalhados pelo corpo com sensibilidade alterada. Tais elementos poderiam ser causados por uma vasoconstricção sob sua área que poderia resultar numa hipóxia suficiente para a produção da dor. Uma alteração já identificada é a diminuição da velocidade de eritrócitos e da temperatura sob os tender points, comparados ao grupo controle.

Enfim essas teorias tentam explicar as manifestações e são utilizadas como critérios maiores e menores da FBM. Um critério maior é a presença de dor por um período não inferior a três meses nas regiões abaixo e acima da cintura, e de ambos os lados, além de dor localizada em 11 dos 18 tender points descritos adiante. Para fechar o diagnóstico é preciso também haver o sono não reparador, sensação de fadiga persistente e rigidez matinal. Pode ainda incluir cefaleia, irritação de bexiga, disminorreia, extrema sensibilidade ao frio, síndrome do cólon irritável, pernas inquietas, padrões indefinidos de parestesias e intolerância a exercícios.

Os 18 tender points (figura 01) se localizam nos seguintes locais :

·                    Inserção muscular suboccipital;

·                    Entre os forames transversos de C5 a C7;

·                    No ponto médio da borda superior do trapézio superior;

·                    Na origem do músculo supraespinhal, logo superior à espinha da escápula;

·                    Na segunda junção costocondral;

·                    Dois centímetros distais dos epicôndilos laterais do cotovelo;

·                    Nos quadrantes superiores externos das nádegas;

·                    À altura do trocânter maior;

·                    No coxim adiposo medial do joelho.

Lembrando que todos esses nove pontos ocorrem bilateral e simetricamente, totalizando 18 tender points.

Estudos indicam que rigidez matinal, distúrbios do sono e sensação de fadiga estão presentes em 75% dos pacientes. O Estudo realizado por HAUN et al. menciona um número 5% maior, além de afirmar que na presença de sintomas definidos não é mandatória a presença de 11 pontos para se fechar o diagnóstico, e sim nove. Os seguintes sintomas (Figura 02) são menos frequentes: palpitação, tontura, sensação de inchaço, cefaleia crônica, depressão, irritabilidade, zumbido, epigastralgia, dispneia, náuseas, dificuldade de deglutição, fenômeno de Raynaud e disminorréia.
FIGURA 02:  Sintomas de fibtomialgia. Disponívem em:  http://clubedafibromialgia.blogspot.com.br/2010/09/sintomas.html.


No início o paciente pode apresentar sintomas subjetivos, tais como a parestesia, dificuldade de concentração, tontura, lipotímia, perda de memória, ansiedade, humor deprimido e irritabilidade. Isso leva a outros sinais que confundem com outras patologias, tais como o aumento dos níveis tensionais, podendo confundir com hipertensão sistêmica. Alguns exames podem então facilitar o diagnóstico, mesmo que para a fibromialgia seja eminentemente clínico. Solicita-se a provas de atividade inflamatória (PCR e VHS), dosagens de hormônios tireoidianos, avaliação do metabolismo ósseo com calcitonina e paratormônio, potássio sérico, CPK, fator reumatoide e anticorpo antinuclear. Mas é necessário lembrar que, assim como afirma Góes em seu estudo sobre fibromialgia, exames laboratoriais não podem incluir ou excluir o diagnóstico de fibromialgia.

O tratamento pode ser feito com diversas classes de medicamentos. Pode ser utilizado um antidepressivo tricíclico, como a amitriptilina 25 mg, com dose a ser ajustada a cada caso. Assim pode-se restabelecer o humor e o sono, além de tratar a dor.  Os antidepressivos tricíclicos em geral trazem melhora após duas semanas de uso.

Os inibidores da receptação da serotonina também podem ser utilizados. Eles possuem a vantagem de não induzirem a dependência, agem sobre o alívio da dor em média em três semanas. Se o transtorno do sono for o sintoma mais forte, a trazadona pode ser utilizada. Ele aumenta a porcentagem de sono profundo, reduzindo a queixa de sono não-reparador ao inibir o receptor 5-HT2A. É apresentado em doses de 50 e 100 mg. Como antidepressivo ele é utilizado na dose de 300 mg, o que indica que para o tratamento da fibromialgia deva ser bem abaixo disso.

O alprazolan é o medicamento mais utilizado nas fases iniciais. É da classe dos benzodiazepínicos. Como psicotrópico é utilizado por via oral na dose de 0,25 a 0,5 mg por três vezes ao dia, sendo absorvido pela mucosa estomacal e alcançando concentração sérica máxima de uma a duas horas após a administração. Sua meia vida é de 11 a 15 horas, com uma ligação a proteínas plasmáticas em torno de 70 a 80%. Ele é metabolizado no fígado a uma forma inativa, a alfa-hidroxialprazolam, que também possui os mesmos efeitos, porém mais brandos.  É lentamente metabolizada, contudo sua excreção pela urina é eficaz. Uma de suas aplicações menos usuais, mas que apresentam boas respostas é no tratamento da síndrome pré-menstrual, embora nesses casos ele só deva ser utilizado na fase lútea, quando a liberação de progesterona tende a incitar maiores efeitos psicológicos.

Os benzodiazepínicos de maneira geral aumentam a quantidade de ácido gama-aminobutírico, promovem a inibição de estímulos excitatórios ao cérebro e aumentam a quantidade de serotonina. Isso promove relaxamento muscular, aliviando os sintomas decorrentes dos tender points. Mas é importante saber que, para todos esses medicamentos utilizados como psicotrópicos, aqui, são utilizados em doses subterapeuticas.

A pregabalina é um anticonvulsivante que demonstra boa resposta no tratamento da dor e dos distúrbios do sono. A dose diária é de 450 mg. O comprimido é apresentado em doses de 25mg, 50mg, 75mg, 100mg, 150mg, 200mg, 225mg e 300mg.  É um ansiolítico análago ao ácido gama-aminobutírico, que não atua nos receptores GABA-A ou B, mas bloqueia os canais de cálcio impedindo a liberação de neurotransmissores excitatórios, a saber o glutamato, aspartato e substância P, esta destacada na fisiopatologia da fibromialgia.

Para o tratamento não farmacológico se deve concentrar primordialmente no principal fator prevalente nos fibromialgicos, o sedentarismo. Os pacientes demonstram melhora da dor, do condicionamento físico, e dos sintomas em geral. Mas deve-se se ater que os exercícios são eminentemente aeróbicos e de alongamento. É comprovado que exercícios aeróbicos melhoram tanto as condições de preparo cardiovascular, como a sensibilidade à dor. Os exercícios devem ser seguidos sempre de relaxamento e de educação postural.

Os resultados acerca da acupuntura, nesses casos, são conflitantes, ao contrário de massoterapia, que é claramente eficaz, possibilitando até a diminuição do uso de analgésicos. Tem-se que essa terapia possua efeitos sobre a modulação supra-segmentar da dor e sobre a secreção de opióides endógenos.  Quanto aos distúrbios do sono é orientado que o paciente suspenda bebidas cafeinadas, evite exercícios físicos à noite, mantenha sempre a rotina do horário de se deitar, manter o quarto escuro e bem ventilado, além da realização de rituais que sinalizem ao cérebro que o momento é de descanso, como uma leitura ou uma oração.


QUESTÕES PSICOSSOCIAIS DA FIBROMIALGIA

Os déficits funcionais do paciente fibromialgico pode ser declarado como adequado ou não adequado. Trata-se do comportamento do paciente no sentido de se adaptar às novas exigências, trazidas pela doença. É adequada quando o paciente mantém suas atividades diárias e se comporta no sentido de controlar a dor, procurando tratamento farmacológico e não-farmacológico. É inadequado quando o paciente se isola do convívio social e do trabalho, ou até mesmo utilizando excessivamente o sistema de saúde, o que pode indicar uma evolução para transtorno psíquico. (RIBERTO, 2002).

Esse mesmo autor afirma que restringir a avaliação do paciente apenas ao sistema musculo-esquelético culmina em frustração do avaliador e do paciente, que termina por sofrer novo encaminhamento devido ao não fechamento do diagnóstico.

Um sintoma que diminui a qualidade de vida é a perda da qualidade de sono. Afflek (1996) afirma que sono não restaurador culmina em dia com sintomas de dor significativamente maiores, que é seguida por uma noite de sono não restauradora, formando um ciclo vicioso. Essa má qualidade de sono foi identificada em 99% dos pacientes avaliados em estudo realizado por Theadom et al. (2007), demonstrando a significância do problema.


REFERÊNCIAS

ELTZ, Rodrigo Sanguinetti. Revisão bibliográfica sobre síndrome da fibromialgia. Monografia apresentada ao curso de fisioterapia da Faculdade de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade de Tuiuti-Pr. Curitiba, 2005. (DESTAQUE)

FRAGA, Bianka Porto; et. al. Fribromialgia e disfunção temporomandibular: uma revisão de literatura. Revista Sul-Americana de odontologia. v. 1. n. 8. p. 89-96. Jan/mar, 2011.

GUI, M.; et. al. Distúrbios do sono em pacientes com fibromialgia. Neurobiologia. v. 73. n. 1. Jan/mar, 2010.

LOPES, Antônio Carlos. Tratado de Clínica Médica. 2. ed. São Paulo: Rocca, 2011.


BRASIL. Pregabalina. Acessoria Jurídica/Advocacia Geral da União. Nota técnica N° 50/2012. Mai, 2012. Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.br/portalsaude/arquivos/pdf/2012/Dez/12/pregabalina(Lyrica%C2%AE).pdf.

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