PNEUMONIA
A definição
não é complexa, sendo uma inflamação do parênquima pulmonar, geralmente
ocorrendo após um desequilíbrio imunológico. Condições predisponentes são uso
de imunossupressores, perda do reflexo da tosse após um avc, perda da função
ciliar por defeito genético ou por ingestão de substâncias cáusticas, congestão
pulmonar ou introdução de bactérias resistentes durante procedimentos
hospitalares. É possível relacionar esses eventos com a proteção das vias
aéreas superiores que ocorre através do movimento ciliar e de uma camada de gel
produzida na intenção de aderir partículas externas posteriormente expelidas
através do movimento ciliar e do reflexo da tosse. Caso essa defesa esteja
prejudicada os patógenos alcançam os alvéolos, que prontamente aumentam a
produção de surfactante por conta de sua ação bactericida. O exsudado
inflamatório a priori defende o organismo, contudo por ser intenso dificulta
gradativamente a hematose.
Se a pneumonia atinge todo o lobo ela é dita lobar. Já quando
a origem da inflamação possui vários focos é dita broncopneumonia. Na lobar
ocorrem quatro estágios: a congestão,
quando o pulmão fica pesado pelo líquido inflamatório alveolar, num momento de
maior colonização e menos neutrófilos; segue a hepatização vermelha, um exsudato repleto de hemácias preenchendo
os espaços alveolares numa congestão repleta de neutrófilos e fibrina; a hepatização cinzenta se caracteriza por
desintegração dessas hemácias; na resolução
há absorção do exsudato por digestão enzimática produzindo grânulos que podem
ser expelidos na tosse, degradados por macrófagos ou organizados numa rede de
fibroblastos.
A pneumonia
adquirida no dia a dia é denominada comunitária, possuindo três grandes padrões:
alveolar, broncopneumonia e intersticial.
Geralmente tem origem bacteriana e dentre os agentes comunitários o mais comum
é o Streptococcus pnaumoniae ou pneumococo, que inclusive faz parte da flora
normal de 20% dos indivíduos. O streptococcus infecta as áreas periféricas do
pulmão e induz uma resposta inflamatória centrífuga a partir dos alvéolos. Este
é o primeiro dos grandes grupos de pneumonia, o alveolar, termo em substituição para lobar.
O segundo
agente mais comum é o staphilococcus aureus, que contamina os condutos aéreos,
sendo por isso chamada de broncopneumonia
ou pneumonia lobular. O terceiro padrão pertence aos vírus, que costumam
infectar o interstício, criando a pneumonite
intersticial.
O Haemophilus
influenzae é relacionado com casos graves. É uma bactéria gran-negativa, naturalmente
colonizadora da faringe que existe sobre duas formas: não encapsuladas (95%) e
encapsuladas. Apesar da diferença das populações as encapsuladas produzem um
produto tóxico para as outras, o haemocin. As formas graves da pneumonia, que
inclusive podem causar meningite envolvem as encapsuladas, em especial um
dentre os seis sorotipos, o tipo B, alvo das campanhas de vacinação. O H. influenzae secreta produtos que
desorganizam o movimento ciliar e também degradam as IgAs presentes na mucosa
aérea. Ademais a cápsula confere resistência à bactéria por sua proteção contra
a opsonização facilitando a disseminação sanguínea. Com tal resistência a
bactéria consegue produzir a laringotraqueíte a partir do entupimento dos
brônquios com exsudato repleto de fibrina e uma consolidação geralmente
esparsa, apesar de também poder acometer todo o lobo. Tudo começa na faringe de
onde pode haver ascensão da infecção causando otite média e conjuntivite purulenta nas crianças. Já nos idosos pode
causar endocardite, pielonefrite e artrite supurativa.
A Mycoplasma
pneumoniae é a terceira causa mais comum. Robins cita a Moraxela catarralis
como um agente cada vez mais comum na população idosa. Staphilococcus está
associada a complicações como o abcesso pulmonar e o empiema. Com o advento da
vacinação a pneumonia causada por Haemophilus vem decaindo, ao contrário da
Klebsiella peneumoniae. Ela produz um quadro característico por conta de um
produto espesso e gelatinoso, por ela produzido, muito difícil de ser expelido
pelo paciente. Geralmente ocorre em pacientes mal nutridos e alcoólatras crônicos.
Já a Legionella pneumophyla é um organismo de ambientes aquáticos artificiais,
tais como tubulações de fontes de água potável. Ela geralmente acomete imunossuprimidos
e produz quadros graves, mas felizmente é facilmente identificável por
anticorpos específicos na urina.
SINTOMAS
Certo! Por isso aí podemos entender os sintomas
que são febre – de início abrupto, tosse purulenta ou sanguinolenta, dispneia e
calafrios. O escarro expelido é espesso amarelado, ferruginoso ou esverdeado.
A percussão identifica áreas de macicez ou submacicez próximo às consolidações.
Na ausculta ocorrem estertores creptantes e diminuição do murmúrio vesicular.
Ocorre também sopro brônquico, broncofonia aumentada e pterilóquia fônica ou
afônica. Quando a pleura é acometida
ocorre a dor pleurítica com ausculta característica. Na fase de resolução
ocorre grande aumento dos estertores, porém logo voltando ao normal. A febre
pode atingir mais de 40° e na maioria dos casos a história clínica identifica
um resfriado pregresso. Nos lactentes os sintomas são dispneia, cianose e febre
alta.
As bactérias
possuem predominância em alguns grupos de pacientes: o pneumococo atinge mais
os adultos e idosos, staphilococcus aureos é mais comum em pessoas em uso de
insulina subcutânea, usuários de drogas injetáveis e abcessos em pele, com as
bactérias alcançando o pulmão por via hematogênica. Klebsiella acomete mais
adultos alcoólatras e com DPOC. Mycoplasma sp ocorre mais em pacientes acima de
50 anos e com doenças associadas.
Existem
manifestações incomuns da pneumonia que caracterizam a pneumonia atípica. O termo vai indicar inflamações bem confinadas,
ausência de exsudato e consolidação, moderada quantidade de escarro e
neutrófilos. Os agentes envolvidos são a Mycoplasma pneumoniae, Chlamydophilia
pneumoniae e Legionella pneumophila, além de alguns vírus tais como o influenza
tipo A e B, rinovírus, vírus sincicial respiratório, adenovírus, vírus da
rubéola e da varicela. A infecção por esses agentes pode causar um resfriado
comum que pode agravar para o estado de pneumonia. Em todos os casos há adesão
à mucosa aérea que culmina em necrose local abrindo passagem para infecções por
outras bactérias que causam a pneumonia comum, que é onde mora todo o problema.
Os sintomas
são incomuns, muitas vezes nem ocorrendo tosse. O quadro simula um resfriado qualquer, com febre, dores de cabeça,
musculares e nas pernas. O edema e exsudato ocorrem de maneira pontual,
exatamente onde ocorre a hematose, com desproporção entre o estado do pulmão e
a dificuldade de respirar. Tais sintomas são tão inespecíficos que o termo
pneumonia atípica está ficando em desuso, já que dificilmente se suspeita de
pneumonia apenas pela clínica. De qualquer forma 25% dos casos de pneumonia por
pneumococo tem concomitância com infecção por algumas dessas bactérias,
justificando a conduta de muitos protocolos de sempre incluir no tratamento da
pneumonia típica antibióticos de cobertura também para as atípicas. A infecção
pelo Staphilococcus é a mais encontrada na pneumonia secundária.
PNEUMONIAS HOSPITALARES
A diferença
aqui é a forma de contaminação e o nível de resistência dos patógenos. É
definida como uma infecção respiratória ocorrida após 48 a 72 horas de
internação hospitalar. Se ocorrer até o quarto dia de internação é dita recente
e após esse dia é tardia. Os fatores de risco são coma, desnutrição, acidose
metabólica, doenças do sistema nervoso, alcoolismo, diabetes, idade avançada,
insuficiência respiratória e uremia.
O maior
mecanismo de contaminação é na intubação orotraqueal, que dificulta a
expectoração do gel contaminado no epitélio brônquico e também pelo
represamento das secreções acima do balonete inflado com posterior aspiração.
Também pode ocorrer por aspirações durante o sono, que ocorre em pequena
quantidade, mas a aspiração se dá com produtos colonizados pela flora
hospitalar resistente. A introdução de sondas nasogástricas fragiliza o
esfíncter esofágico inferior e facilita aspirações, além de que esse tipo de
alimentação eleva o conteúdo gástrico. Nas aspirações por conteúdo gástrico as
bactérias geralmente são gran-negativas e da porção superior do esôfago são
gran-positivas.
Os agentes
mais comuns são pseudomonas e acinetobacter (gran -), envolvidos em até 85% dos
casos. A pneumonia recente geralmente é causada por bactérias da comunidade
(streptococcus pneumoniae, hemophilus influenza e staphilococcus aureos
oxacilino sensível) e após esse período costuma ocorrer com bactérias da própria
flora hospitalar (pseudomonas, enterobacter, acinetobacter e staphilococcus
aureus oxacilino resistente). Os procedimentos com suas bactérias relacionadas
são:
·
Aspiração ou cirurgia abdominal recente –
anaeróbios;
·
Coma, trauma, usuários de drogas, diabéticos e
episódio gripal antecedente – staphilococcus aureus;
·
Corticoide em alta dose – Legionella;
·
Ventilação mecânica, internação prolongada em
uti, desnutrição e uso de corticoides – pseudomonas aeruginosa;
·
Antibioticoterapia prolongada e ventilação
mecânica – staphilococcus aureus oxacilino resistente.
DIAGNÓSTICO
COMUNITÁRIA
O recomendado a título de diagnóstico inicial é radiografia de tórax e broncoscopia. Cultura de escarro não deve ser feita após iniciar antibioticoterapia e é pouco sensível nos casos de pneumococo. Antígenos urinários podem ser solicitados para diagnosticar infecção por Legionella. A broncoscopia então é o exame de maior sensibilidade e especificidade. Feito isso existem cinco pontos que norteiam a identificação da gravidade: confusão mental, ureia elevada, taquipneia, hipertensão e idade acima de 65 anos, além do escore PORT, o principal norteador de seguimento.
O recomendado a título de diagnóstico inicial é radiografia de tórax e broncoscopia. Cultura de escarro não deve ser feita após iniciar antibioticoterapia e é pouco sensível nos casos de pneumococo. Antígenos urinários podem ser solicitados para diagnosticar infecção por Legionella. A broncoscopia então é o exame de maior sensibilidade e especificidade. Feito isso existem cinco pontos que norteiam a identificação da gravidade: confusão mental, ureia elevada, taquipneia, hipertensão e idade acima de 65 anos, além do escore PORT, o principal norteador de seguimento.
HOSPITALAR
Por conta da
presença de outras patologias os exames diagnósticos para pneumonia hospitalar
deve ser bem correlacionado com a condição clínica. O primeiro passo pode ser a
radiografia de tórax, que poderá demonstrar infiltrado intersticial e o
broncograma aéreo, que é preditivo de pneumonia em 64% dos casos. O CDC estabelece
o diagnóstico a partir da ausculta de estertores, macicez à percussão e
infiltrado pulmonar surgido durante internamento. Esses dados devem se combinar
com um dos seguintes critérios: escarro purulento; agente infeccioso isolado no
sangue, biopsia pulmonar, aspirado traqueal ou escovado brônquico; isolamento
do vírus nas secreções brônquicas; e anticorpos de agente infecciosos.
Para o
paciente não estiver entubado pode-se fazer a coleta de escarro, cultura
qualitativa ou quantitativa do conteúdo brônquico, sendo a quantitativa mais
adequada e sendo positiva quando ocorre 1.000.000 de unidades formadoras de
colônias. O lavado broncoalveolar é aquele com melhor valor preditivo positivo.
Podem ainda ser realizados cultura de escarro, aspirado endotraqueal, punção
aspirativa transcutânea (métodos não broncoscópicos), lavado broncoalveolar
protegido e convencional, além do escovado brônquico protegido.
TRATAMENTO
O primeiro
passo é definir se o tratamento será domiciliar ou hospitalar. Deve-se utilizar
o escore PORT. IV e V exigem internamento, III demanda breve estadia. Considere
a internação se: 1- o paciente tiver comorbidades respiratórioas, desnutrição,
alcoolismo, IC ou diabetes; 2- FR > 30 inc/min, FC > 125 bpm, T° < 35
ou > 40; 3- leucócitos < 4.000 ou > 30.000; 4- coagulopatia, acidose e
radiografia apontamento comprometimento difuso; 5- Saturação < 60; 6- TA sist < 90 mmHg.
Para
internamento em UTI podem ser usados os critérios, devendo haver um maior ou
dois menores. Maiores: choque ou necessidade de ventilação mecânica; Menores:
acometimento de dois ou mais lobos, TA sist. < 90 mmHg e a relação pressão de O2/Fração inspiratória de O2 < 250.
Caso a FR
>30 inc/min, TA sistólica < 90 mmHg e diastólica < 60 mmHg, e confusão
de início recente está indicado internamento em UTI. Com esses sinais
o risco de morte aumenta 21 vezes.
Daí se o
paciente for PORT I ou II a primeira escolha é amoxicilina (uma penicilina), já
que o germe mais comum é o pneumococo. Aliado a isso, na intensão de cobrir germes
atípicos pode-se utilizar um macrolídeo, como eritromicina 500 mg a cada 12
horas. Nos casos de PORT III, IV ou V pode-se utilizar ceftriaxone
(cefalosporina de terceira geração) junto com um macrolídeo. Esquema específico
para o POTR III é um macrolídeo ou quinolona respiratória (levofloacino), para
os PORT IV e V é uma quinolona respiratória, atentando para a necessidade de
internamento em UTI para o PORT V . Caso o paciente tenha feito uso de
antibiótico de amplo espectro por mais de sete dias nos últimos trinta dias
deve-se considerar infecção por pseudomonas e utilizar cefepime (cef de 4°
ger), com opção de imipenem ou meropenem (carbapenens) em monoterapia ou
associado a ciprofloxacino. Em caso de cepas resistentes deve ser utilizada a
polimixina (atentando para a efeitos indesejáveis da droga).
Na
classificação PORT III considera-se uso de quinolona isolada, a levofloxacina.
Em PORT V é consenso utilizar a cefalosporina associada a quinolona
respiratória, a levofloxacina, lembrando que paciente em tratamento
ambulatorial deve ser tratado por sete dias e internados por 14 dias. Nos casos
de Legionella deve ser utilizada a quinolona respiratória por 21 dias.
Na pneumonia
aspirativa ainda devem ser consideradas se os eventos são infecciosos ou
meramente inflamatórias por aspiração química. Se for química deve-se prover
sintomáticos e aguardar por 24 a 48 horas. Se persistirem os sintomas
considera-se pneumonia aspirativa e entra-se em duas vertentes: se não houver
fatores de risco trata-se com ceftriaxona 2 g ao dia; se houver fatores de
risco acrescenta-se ceftriaxona ou metronidazol.
REFERÊNCIAS
LOPES, Antônio Carlos. Tratado
de Clínica Médica. 2. ed. São Paulo: Rocca, 2009.
MARTINS, HERLAN SARAIVA ET AL. EMERGÊNCIAS CLÍNICAS DA USP. 8. ED. Barueri:
Manole, 2013. p. 572-592.
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