segunda-feira, 24 de março de 2014

EPISTAXE: O QUÊ ESSE SANGRAMENTO EXIGE?

ANATOMIA DAS VIAS RESPIRATÓRIAS






O sistema respiratório se inicia com o nariz, que é dividido em cavidades direita e esquerda, sendo dividido pelo septo nasal. É dividido também em nariz externo e interno. O septo nasal é composto por:
·                    Lâmina perpendicular do etmoide;
·                    Vômer;
·                    Cartilagem do septo.

Com exceção do vestíbulo, todo o nariz é revestido por túnica mucosa, que é firmemente agregada ao periósteo dos ossos que compõe o nariz. O teto do nariz é composto por parte do ossos etmoide, esfenoide e nasal.

Fossas nasais são divididas em 3 porções: vestíbulo (tec. Epitelial estratificado não queratinizado), a área respiratória (célula colunar ciliada, células caliciformes, células em escova, células basais e granulares) e área olfativa (células de sustentação, células basais e neurônio bipolares). Os seios paranasais também possuem cílios, e possuem epitélio pseudo-estratificado colunar ciliado.

A laringe é um conduto irregular formado por cartilagens unidas por tecido conjuntivo fibroelástico. Nas pregas vocais e epiglote, já que vai haver atrito, o tecido é estratificado não queratinizado. O restante é respiratório.


SUPRIMENTO ARTERIAL DO NARIZ

FIGURA 02: principais vasos relacionados com a epistaxe.

Os ramos em questão são: artéria esfenopalatina, artérias etmoidais anterior e posterior, artéria palatina maior, artéria labial superior e ramos nasais da artéria facial. Na parte anterior do septo nasal encontra-se uma área rica em capilares chamada de área de Little, onde se encontra o plexo de Kisselbach. Esse plexo drena para as veias esfenopalatina, facial e oftálmica. Uma das funções do plexo é de termorregular o corpo, pois ele disponibiliza calor para aquecer o ar que entra nos pulmões.

O nariz se continua com a faringe, que possui sua maior porção direcionada à função da deglutição. É formada em três porções: superior, que possui as comunicações com o nariz, com a orofaringe e com os óstios da tuba auditiva; a porção intermediaria ou orofaringe vai do palato mole até o osso hioide. Essa porção serve de passagem tanto do ar, como do alimento; a laringofaringe continua até o esôfago anteriormente e com a laringe posteriormente.

Na faringe há presença de tonsilas, que recebem ramos das artérias facial, lingual, palatina ascendente e descendente e faríngea ascendente. Os dois maiores vasos que participam da rede sanguínea da faringe são a artéria tonsilar e a veia palatina externa. Daí conectando a faringe com a traqueia está a laringe, esta detentora das cordas vocais, assim como servindo para a condução de ar. Ela se estande à altura de C3 a C6 e se constitui em nove cartilagens, dentre as quais estão a tireóidea – a maior de todas – e a cricoidea. Os dois terços inferiores das cartilagens da laringe se fundem anteriormente para formar uma proeminência chamada de pomo de Adão ou proeminência laríngea. A cartilagem cricóide tem formato de anel de sinete, com a porção anterior sendo formada pela cartilagem e a porção posterior sendo formada por fibras que formam a lâmina. Mesmo sendo menor em relação à cartilagem tireóide, a cricóide é mais espessa e mais resistente, sendo ainda a única que forma um anel completo. 

As artérias que suprem a laringe se formam a partir das artérias tireóideas superior e inferior, sendo então chamadas de laríngea superior e laríngea inferior. Já as veias seguem a direção contrária, estando na laringe como veias laríngeas superiores e inferiores e drenam para as veias tireóideas superior e inferior.

Da mesma forma incompleta são os anéis da traqueia. Essa incompletude é preenchida pelo músculo traqueal. Ela se inicia a nível de C6, onde termina a laringe e acaba a nível de T4 a T5, onde se dividem os brônquios. Dentre os vasos mais importantes próximos à traqueia estão as carótidas comuns. A traqueia se divide em brônquios principais direito e esquerdo numa região denominada carina.  O brônquio principal direito é mais vertical, curto e a mais largo em relação ao esquerdo.  Esses brônquios se dividem em brônquios lobares, que por sua vez se subdividem em bronquíolos, esse sendo a única porção não constituída por cartilagem. Segue-se então os ductos alveoáres, continuando como um conjunto de estruturas em cachos de uva denominado alvéolos.


EPISTAXE

                                                          FIGURA 03: evidência clínica da epistaxe.

Epistaxe tem incidência bimodal, ocorrendo raramente nos lactentes e evoluindo para o primeiro pico aos 7-13 anos de idade, com segundo pico na velhice aos 50-80 anos devido a alterações vasculares. Na infância 80% dos sangramentos ocorrem na porção anterior da cavidade nasal no plexo de Kisselbech. Essa porção anterior é uma das possibilidades, a saber: anterior, superior e inferior. O sangramento anterior costuma vir do citado plexo, onde existem muitas artérias anastomosadas vindas das etmoidais, da palatina ascendente, da esfenopalatina e do ramo septal da labial superior. O sangramento também pode advir de veias próximas ao plexo de Kisselbach. O sangramento posterior vem das artérias esfenopalatina e a superior vem das artérias etmoidais.

Expistaxe costuma ocorrer nos meses mais frios e secos e as causas mais comuns são: 1- causa nasal pode ser devido a trauma por atrito digital, infecção, sinusites, alterações anatômicas como o desvio acentuado das fossas nasais que causa maior atrito entre o ar e o epitélio determinando ressecamento das mucosas e fragilidade dos vasos, ar seco, poeira, substâncias irritantes, tumores e iatrogenias durante a passagem de sondas; causa vascular pode ser hipertensão arterial por aumento da pressão e fragilidade dos vasos característica da idade e arteriosclesrose; causas por discrasia sanguínea são hemofilia, leucemia, anemia, púrpura trombocitopênica; e causas diversas são gravidez, trauma e tumores.


QUADRO CLÍNICO E TRATAMENTO

Na maioria das vezes se manifesta com o paciente em posição ortostática. Os sangramentos anteriores surgem pela narina e tendem a ser de baixa intensidade. Os sangramentos posteriores podem surgir da parte oral e nasal da faringe, geralmente advindo de vasos mais calibrosos e por isso costumam ser mais intensos. A depender da quantidade de sangue perdido e do momento, como no sono, o paciente pode engolir e posteriormente cursar com hematêmese ou hemoptise caso haja aspiração.

A causa mais comum na criança é o trauma digital. Corpo estranho também é comum, geralmente com sangramento unilateral e com modificação da secreção para purulenta e fétida. A dor sempre vai ocorrer. Em determinadas doenças infecciosas como o sarampo, o paciente cursa com fragilidade vascular e sangra espontaneamente. Em crianças e adolescentes do sexo masculino com sangramento intenso deve-se desconfiar de angiofibroma juvenil e tumores. O sangramento pode ocorrer também por realização de biopsias e costumam assustar.

O angiofibroma, também conhecido como nasoangiofibroma, é um tumor benigno, sangrante e que ocorre na nasofaringe, ou seja, na região posterior do nariz de algumas pessoas jovens do sexo masculino. Esta doença ocorre exclusivamente em pessoas do sexo masculino e geralmente é diagnosticada na adolescência por conta de obstrução nasal e sangramentos nasais frequentes. Outros sintomas possíveis podem ser dores de cabeça, dor facial, secreção nasal, diminuição do olfato, dentre outros. Em tumores grandes, pode haver inclusive deformidade facial.”

Quando o sangramento é grande fica difícil identificar onde é o local de origem, o que é importante para se dirigir o tratamento. O uso de rinoscópio com fonte de luz e um aspirador que retire os coágulos e o próprio sangramento são eficazes. Como nas crianças o sangramento ocorre bem mais no plexo de Kisselbach a localização costuma ser fácil. Pode-se introduzir gaze embebida com vasoconstrictor e anestésico e pressionar por alguns minutos. Em seguida pode-se retirar o tampão para identificar a origem do sangramento e daí cauteriza-lo quimicamente com ácido tricloroacético ou nitrato de prata, ou simplesmente proteger o local com neomicina, a conduta mais adequada.

Em relação ao adulto, nas epistaxes anteriores o próprio paciente pode comprimir o local por 5 a 10 minutos. Na realidade a compressão é de toda a porção cartilaginosa externa do nariz, depois da introdução de um chumaço simples de algodão no nariz, sem necessidade de se levantar a cabeça.

Existem três tipos de tamponamento. Tamponamento nasal anterior pode ser aplicado em sangramentos anteriores e superiores, é empregado em sangramentos intensos vindos da concha inferior e da região ântero-superior do septo, onde a cauterização é dificultada. Pode introduzir um gaze untada com pomada – neomicina por exemplo – ou vaselina utilizando-se uma pinça. Deve-se tomar cuidado para não restringir a gaze ao contato apenas com o vestíbulo, devendo ser posicionado mais póstero-superior possível. Em vez de gaze também pode ser utilizado dedo de luva preenchido por gaze. Sangramentos no septo e no plexo de Kisselbach são bem responsivos a essa manobra.

O tamponamento ântero-posterior é indicado para sangramentos posteriores de grande intensidade. Pode-se introduzir uma sonda de Foley até a região oral da faringe, quando então é inflada parcialmente com água. Traciona-se a sonda para trás até seu ajuste na área de sangramento. A sonda deve ser fixada na pirâmide nasal ou na própria testa do paciente.

Essa manobra é eficiente, mas há casos não resolvidos. Nesse caso há um último recurso, inclusive mais traumatizante. Introduz-se uma sonda nasal pelo nariz até que se atinja a cavidade oral. Na extremidade exposta na cavidade oral enrola-se uma gaze ou um dedo de luva preparado antes de tudo. A sonda então é tracionada para trás ajustando à área de sangramento. Por último coloca-se gaze pela entrada da narina até o local de tamponamento anteroposterior, certificando-se assim de que haverá formação de coágulo que estancará o sangramento. O paciente deve permanecer internado por no mínimo 48 horas, período esse em que deverá ser mantido com o tampão e monitorado com atenção. Quando nenhuma dessas manobras não surtem efeito resta a eletrocoagulação ou a ligadura das artérias sangrantes através de cirurgia endoscópica transnasal.
Observe no vídeo abaixo algumas manobras do atendimento emergencial.




DIAGNÓSTICO

Esse evento é eminentemente clínico, mas deve-se solicitar hemograma completo e coagulograma para verificar outras condições associadas.


            REFERÊNCIAS

HEINICHEN M., Julio. Epistaxe na Infância. VII Manual de Otorrinalaringologia Pediátrica da IAPO. p. 175-176. Disponível em: http://www.iapo.org.br/manuals/vii_manual_br_26.pdf

VALERA, Fabiana C. P.; TAMASHIRO, Edwin; HIPPOLITO, Miguel A.; ANSELMO-LIMA, Wilma T. Protocolo Clínico e de Regulação para Epistaxe. Disponível em: http://www.saudedireta.com.br/docsupload/1333460427epistaxe.pdf

BALBANI, A. P. S.; FORMIGONI, G. G. S.; BUTUGAN, O. Tratamento da Epistaxe. Revista da Associação Médica Brasileira. v. 45. n. 2. p:189-193, 1999.


LOPES, Antônio Carlos. Tratado de Clínica Médica. 2. ed. São Paulo: Rocca, 2009.

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