LEISHIMANIOSE VISCERAL
Existem três
formas para a L. chagasi: amastigotas, promastigota, promastigotas
metacíclica e paramastigotas. O parasita
é transmitido pelo inseto denominado lutzomia longipalpis através da picada,
quando então transmite a forma promastigota metacíclica. Como durante a picada
o inseto inocula uma saliva com potenciais de antiagregação plaquetária e vasodilatadora, o sangramento é
fluido e com isso facilita a passagem dos parasitas. Na realidade o
vasodilatador presente na saliva do lutzomia é o mais potente que existe: o
maxidilan. Dentro do corpo as formas infectantes escapariam da ação dos
macrófagos por terem em sua membrana
plasmática o polimorfismo intraespecífico do lipofosfoglicano (LPG), que
dificulta a agregação das frações C3b do complemento, havendo ainda a proteína
gp63, com papel de clivagem do C3b.
As formas
infectivas então conseguem se aderir à membrana do macrófago para ser logo
endocitado. Enquanto a vesícula lisossomal fica em processo de fusão com a
membrana do vacúolo contendo o parasita, esse se transforma na forma
amastigota, que por conta da proteína gp63 e produção de proteases, consegue
sobreviver ao derrame ácido dos lisossomos. Naqueles em que a doença não se
manifesta os lisossomos conseguem vencer esses dois mecanismos, mas na maioria
das vezes ocorre a intensa reprodução do parasita até que a célula hospedeira
se rompa liberando as formas para infectarem outros macrófagos.
Todo esse
processo pode ocorrer em qualquer animal vertebrado. Quando o inseto realiza o
repasto nos animais com formas amastigotas no sangue, o alimento vai até seu
intestino e então é cercado por uma membrana quitinosa que protege o parasita.
Na membrana desse então vai desenvolvendo a proteía gp63 e o LPG para que rompam
a quitina e resistam às enzimas digestivas quando forem liberadas. Após três a
quatro dias de intensa proliferação eles se transformam em formas flageladas
paramastigotas que dotadas de flagelo
conseguem se fixa na parede do intestino até que seu flagelo tenha capacidade
de arraste, a forma promastigota metacíclica. Nessa fase o parasita é puxado
pelo flagelo para as porções superiores do trato digestivo e adentra no corpo
do humano durante o repasto. Acredita-se que com a alimentação do parasita e a
digestão do próprio mosquito o estômago desse fique vazio e ácido, deflagrando a
transformação para a forma paramastigotas.
A imunidade
envolvida na infecção pela leishimania envolve a sinalização em macrófagos por
moléculas de MHC de classes I e II nas membranas dos linfócitos. Nos linfócitos
TH 1 liberam INF-gama e citocinas pró-inflamatórias diretamente, enquanto que
os linfócitos TH 2 liberam IL-4, que estimulam linfócitos B a produzirem
imunoglobulina. A grande importância nessa informação é que a resposta TH 1
consegue debelar a infecção, enquanto que a TH 2 está relacionado com a doença
progressiva, porque, nesse caso, as imunoglobulinas produzidas pelos linfócitos
B são inespecíficas. A propensão genética de cada indivíduo, prepoderando uma
resposta ao invés da outra vai determinar a suscetibilidade para a doença ou
para a cura.
Uma das
funções da saliva do mosquito não mencionada é a sua atividade
inflamatória, tendo o efeito de atrair macrófagos que servirão de sítio de
replicação para o Laishimania. Por vezes essa inflamação é mais proeminente e
no local de inoculação se forma um nódulo hiperemiado, o leishimanioma,
normalmente regredido sem maiores problemas. Os macrófagos contaminados são levados
para a corrente sanguínea até os demais órgãos disseminando a presença do
parasita. Quando um macrófago infectado se aloja em um órgão ele secreta
citocinas que atraem outros macrófagos não infectados para serem invadidos e
assim perpetuar a infecção. Os órgãos
mais cometidos são o fígado, o baço, linfonodos e medula óssea.
A alteração visceral mais comum é o aumento do baço, onde a grande quantidade de macrófagos obstruem vasos e promovem congestão e infarto. A superfície ganha uma cor avermelhada e marrom, além de friável. O Fígado também ganha alterações importantes, ficando também congesto, infiltrado difuso de células inflamatórias que causam fibrose septal e portal. No início da infecção a produção de células sanguíneas é normal, mas com o tempo a medula torna-se parasitada e é aos poucos substituída por macrófagos parasitados, repercutindo numa diminuição gradual da hematopoese. Primeiro ocorre uma hiperplasia do setor histiocitário (que contém células predecessoras do monócito), depois hiperplasia do setor de células vermelhas e por fim ambas as áreas entram em colapso deflagrando uma anemia grave.
Ainda mais
frequente que a alteração esplênica é a alteração hematológica, pois nesse caso
são diversas. A anemia formada é normocítica e normocrômica, mas ocorre
rebaixamento de eritrócitos, ficando entre 2 e 3 milhões por conta da hemólise.
Pode ocorrer ausência de eosinófilo, neutrófilos com redução importante, assim
como linfócitos, construindo a leucopenia evidente. As plaquetas estarão
diminuídas nos quadros graves e adiantados, e como vai haver grande produção de
células sanguíneas compensatórias, o RDW estará aumentado em alguma fase da
evolução, podendo, inclusive estar acima de 16. As lesões renais ocorrem por
deposição de imunocomplexos, além de fibrinogênio e proteínas do complemento.
Isso determina um ataque aos glomérulos, assim como na glomerulonefrite
pós-estreptocócica, quando a agressão da barreira glomerular permite a passagem
de proteínas causando grave depleção de proteínas. Contudo, esse fenômeno não é
comum, sendo a hipoproteinúria causada pelo comprometimento hepático – pois o
fígado é responsável pela produção de albumina – e o grande gasto para manter a
intensa reposição de células sanguíneas destruídas (um efeito comum em
infecções intensas e prolongadas), aliada à desnutrição.
QUADRO CLÍNICO
A doença se inicia com febre intermitente, palidez de mucosas e
hepatoesplenomegalia. O paciente entra numa fase de emagrecimento progressivo
chegando até a caquexia. O paciente pode evoluir com tosse seca (até 81% dos casos),
diarreia e dor abdominal, geralmente na fase aguda. Por conta do
comprometimento da medula o paciente evolui com anemia, sangramento gengival e
epistaxe. A hemólise de hemácias culmina na icterícia. Ainda ocorrem o edema e
a ascite. No caso da icterícia, junto com hemorragias digestivas, tem-se sinais
de gravidade. Esses dois sinais são os principais indicativos de gravidade em
pacientes portadores de HIV, nos quais o óbito pode ocorrer mesmo antes dos
sintomas descritos.
Dentro desses
sintomas gerais os pacientes são divididos entre aqueles assintomáticos ou
oligossintomática, e sintomáticos de forma aguda ou crônica, esta dita
clássica.
Na forma
assintomática ou aligossintomática o paciente pode apresentar sintomas
discretos e inespecíficos, tais como febre baixa recorrente, tosse seca,
diarreia, sudorese e prostração, e por fim evoluir para cura ou ausência de
sintomas por toda a vida como ocorre com a maioria dos infectados das áreas
endêmicas. Esse equilíbrio pode ser quebrado, no entanto, por um estado
imunossupressivo importante, como a infecção pelo HIV ou uso de medicamentos
imunossupressores.
Na forma
aguda ocorre a febre alta, palidez de mucosas e hepatoesplenomegalia discretas,
com evolução não maior que dois meses e podendo apresentar diarreias e tosse
seca. A febre continua intermitente ao mesmo tempo em que ocorre desnutrição
proteico-calórica e caquexia se mantém mesmo naqueles com apetite preservado. Como o
paciente irá cursar com baixa de proteínas é comum o edema generalizado. Há
também dispneia, cefaleia, dores musculares, diarreia, epistaxes e atraso da
puberdade. A hepatoesplenomegalia aliada à ascite culminam num abdome com
grande dilatação.
Como a
leishimania vai destruir células de defesa, abre então passagem para infecções
oportunistas, tais como as pneumonias, tuberculose e diarreias, na maioria dos casos por Shigellose e amebíase, podendo ser a última complicação antes do óbito. Há
também concomitância com a esquistossomose.
DIAGNÓSTICO
Se baseia em
três parâmetros: anamnese e exame físico, quando se avalia o contato com área
endêmica e os sintomas já descritos; exames sorológicos e imunológicos, quando
se solicita a pesquisa por anticorpos anti-leishimania e ainda há o teste com o
antígeno rK39 fixado em papel; punção aspirativa ou biopsia esternal em adultos ou crista ilíaca em crianças. O
problema dos testes sorológicos e imunológicos é que eles possuem pouca
especificidade, a exceção do rK-39, que é indicativo de doença em atividade.
Como a doença pode se manifestar muitos dias após a infecção, não há como saber
se o IgG é de três meses ou de um ano, ou seja, pode ser de uma infecção já
curada. A aspiração pode ser realizada no fígado, que tem pouca expressão das
formas amastigotas, no baço, que oferece risco de sangramento, ou na medula do
esterno ou crista ilíaca. A intensão é visualizar o parasita.
TRATAMENTO
Sem
tratamento a mortalidade da leishimaniose pode chegar a 90%. Por isso as
medicações utilizadas são utilizadas mesmo apresentando grande toxicidade. A
primeira escolha é o antimoniato de metilglucamina, vendido sobre o nome
Glucantime. Ele é aplicado na dose de 20 mg/Kg/dia por via parenteral, com dose
plena de 850 mg. O tratamento é
realizado por um período mínimo de 20 dias. Nos pacientes que não toleram esse
medicamento ou estão gestantes é
utilizada a anfotericina B em 15 a 20 mg/Kg/dia por via intramuscular, e
período de 30 a 40 dias. Pode-se ainda fazer o tratamento por via intravenosa,
e como a anfotericina tem maior eficácia contra a patologia, no esquema parenteral
são necessárias uma dose de 5 mg/Kg/dia por apenas cinco dias.
O glucantime é utilizado na dose de 12 a 20 ml para o paciente de 60 Kg, diluídos em solução glicosada na quantidade de 2 a 3 ml por 10 quilos de peso, correndo o medicamento na velocidade de na velocidade de 1 ml por minuto. Cada ampola contém 5 ml e também pode ser utilizada por via intramuscular. Nesse esquema são dadas de 10 a 20 injeções em duas séries com intervalo de quinze dias.
Os critérios
de cura são a melhora dos sintomas, ganho de peso e retorno a algum nível de
eosinófilos, que durante a doença costuma zerar. Também é necessário haver
redução significativa do volume do baço, embora deverão passar vários meses
para voltar ao normal. A normalização da hipoproteninemia também pode durar
meses e por isso não é critério de cura. A recidiva é considerada se houver
retorno dos sintomas num período menor que 12 meses.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Leishimaniose visceral: recomendações clínicas para
redução da mortalidade. Série A: Normas e Manuais técnicos. Ministério da Saúde. Secretaria de
Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Brasília, 2011.
SOUZA, Marcos Antonio de. Leishimaniose visceral humana: do
diagnóstico ao tratamento. Disponível em: http://www.facene.com.br/wp-content/uploads/2010/11/Leishmaniose-visceral-humana_com-corre-%E2%94%9C%C2%BA%E2%94%9C%C3%81es-dos-autores_25.10.12-PRONTO.pdf.
NEVES, David Pereira. Parasitologia
Humana. Ec. 11. Arheneu: São Paulo, 2005.
Um comentário:
Acho que o nome esta errado... é Leishmanioses
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