Todas as modificações
relacionadas à hipertensão arterial (HA) no idoso giram em torno da forma como
o coração responde ao aumento da resistência vascular, e de todos os motivos
que o deflagram, a rigidez vascular com aumento de pós-carga é o de efeitos
mais evidentes. Esse aumento determina algumas consequências: aumento do átrio
esquerdo, hipertrofia do ventrículo esquerdo (HVE), distúrbios de enchimento de
câmaras cardíacas, como a diminuição do enchimento ventricular, que pela lei de
Frank-Starling culminará numa contração menos vigorosa. Com isso a dependência da contração atrial na
ejeção do sangue, que no jovem se limita a 20%, vai aumentar.
Ocorre um processo degenerativo
nas paredes dos grandes vasos através da diminuição da elastina e ruptura de
fibras da mesma, e substituição por colágeno – menos distensível, deposição de
cálcio, espessamento da parede, diminuição da luz e diminuição da complacência.
Como a complacência vai diminuir, haverá um menor amortecimento das pressões,
por isso, os pequenos vasos recebem ondas tensionais e as devolvem para os
níveis anteriores causando amplificação da pressão arterial sistólica,
culminando na hipertensão arterial sistólica isolada. Uma sucessão de processos
arterioscleróticos termina por diminuir a luz dos vasos, a exemplo do que
ocorre nas artérias renais, coronárias e carótidas, havendo maior acometimento
no sexo masculino.
Como ocorre redução geral da
massa muscular no idoso, vai haver redução do número de miócitos, nesse caso
devido à perda de capilares na parede miocárdica. Os miócitos que sobrarem vão
se hipertrofiar, acompanhado do aumento também do colágeno intercelular,
resultando no aumento da espessura do ventrículo, principalmente o esquerdo. Outras
alterações são fibrose disseminada, depósito de lipofuscina em fibras
cardíacas, calcificação do miocárdio e amiloidose senil (reação inflamatória
secundária ao depósito da proteína amiloide). A fibrose e a calcificação
citadas se estendem às cordas tendíneas causando espessamento com
comprometimento de função.
Vai ocorrer diminuição da reserva
funcional (resistência fisiológica contra alterações a ponto de manter o
indivíduo sem sintomas), principalmente aos esforços pelas seguintes questões:
diminuição da resposta ao aumento da frequência cardíaca; diminuição da
complacência do ventrículo esquerdo com consequente retardo do relaxamento e
elevação da pressão atrial; diminuição da complacência dos vasos e aumento da
resistência periférica já citados; diminuição do consumo máximo de oxigênio
durante atividades mais vigorosas; diminuição da resposta a catecolaminas.
Sobre esse último, ocorre uma queda da sensibilidade dos receptores beta e uma
manutenção dos receptores alfa. Os primeiros têm efeito dilatador e os segundos,
vasoconstrictor, justificando a tendência natural ao aumento da resistência
vascular periférica (RVP). Ocorre ainda queda da resposta do sistema
barorreceptor e do sistema renina-angiotensina-aldosterona, que aliado a menor
competência do organismo em transportar oxigênio, induzirá à hipotensão
ortostática no idoso. Todas essas questões envolvendo receptores e efeito
inotrópico e cronotrópico vão fazer com que o idoso não consiga aumentar sua
frequência cardíaca nos exercícios e com isso sua capacidade física cai.
Com o metabolismo hepático
diminuído – diminuição de síntese de ácidos biliares, retardo da depuração de
lipoproteínas, modificações no tamanho da molécula HDL – haverá tendência à
formação de placas ateroscleróticas em diversos seguimentos vasculares. Isso
culmina no fato de que aproximadamente 90% dos octagenários cursam com doença
arterial coronariana, apesar de apenas 30 a 40% apresentarem sintomas
(WAJNGARTEN, 2010). Outro estudo
promovido pelo Cardiovascular Healt study, analisando mais de 6.000 pacientes,
identificou que apenas 20% da população de cinco comunidades americanas não
sofre de doença arterial coronariana.
O depósito da proteína amiloide,
tão importante na gênese do Alzheimer, aqui também causa estragos por indução
de atividade inflamatória, contribuindo para a ocorrência de arritmias, da
quais a mais comum é a fibrilação atrial, com prevalência de 0,1% em pacientes
menores de 55 anos e mais de 9% naqueles acima de 85 anos, estabelecendo para
esses um risco de eventos embólicos de 23,5%.
HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA NO IDOSO
A definição e diagnóstico da
hipertensão arterial no idoso são semelhantes ao do indivíduo jovem. A
hipertensão arterial sistêmica (HAS) é uma condição clínica multifatorial
caracterizada por níveis elevados e sustentados de pressão arterial (PA). Deve
ser diagnosticada em ao menos duas medidas casuais com níveis pressóricos acima
de 140 X 90 mmHg. É necessário se atentar para o hiato auscultatório, que é um
período inaudível no momento da ausculta, podendo ocasionar resultados
sistólicos falsamente mais baixos e diastólicos falsamente mais altos. Por isso
é recomendado que seja realizado o MAPA (medida ambulatorial de pressão
arterial), minimizando erros de aferição.
A Hipertensão no idoso alcança
uma prevalência de 60 a 80%. Para entender a hipertensão no idoso é importante
a compreensão da hipertensão sistólica isolada, pois essa vai ser a principal
forma de apresentação. A pressão sistólica tende a aumentar ao longo da vida,
porém a diastólica aumenta até os 55-60 anos e a partir daí se mantém. 40% de
todos os indivíduos acima de 60 anos apresentam pressão sistólica aumentada com
diastólica normal. Esse número corresponde a 2/3 de todos os hipertensos.
A gênese na hipertensão sistólica
isolada é a perda da complacência dos vasos e a consequente pressão reflexa já
explicada neste texto. Nos indivíduos jovens, a onda reflexa – onda de pulso –
volta para a aorta ascendente mais atrasada, no fim da diástole seguinte à
sístole fonte da onda. O tempo gasto para isso é maior em relação ao idoso, e
por isso a pressão da onda de pulso se equilibra com a pressão diastólica e por
fim com a sistólica seguinte, aumentando a pressão central. Já nos idosos, como
a complacência dos vasos está diminuída, a onda reflexa volta para a aorta na
própria sístole somando-se a pressão sistólica natural, porém não influenciando
a diástole. Fatores que influenciam todo esse processo de incompetência dos
vasos em amortecer a pressão sistólica são a deficiência de estrógeno,
tabagismo, diabetes e aumento da homocistoína.
Se algum estímulo contínuo exige
que o ventrículo se contraia mais vigorosamente, ele irá causar a Hipertensão
sistólica isolada. Com esse aumento de pressão o estresse das paredes do
ventrículo também cresce e por isso elas se hipertrofiam e se enrijecem, já que
também vão sofrer com quebra das fibras de elastina, aumento do colágeno e
distorção na orientação das fibras musculares.
Uma peculiaridade no idoso é a
pseudo-hipertensão, sendo definida pela manobra de Osler, que é a palpação do
pulso radial mesmo com a hiperinsuflação do manguito do esfingmomanômetro. A
presença da pseudo-hipertensão é sinal de processo aterosclerótico, e marcador
de complicações cardiovasculares, justificando a diferença da pressão arterial
aferida nos dois braços.
Um problema adicional é a maior
responsividade do idoso ao sódio e menor produção de óxido nítrico, que
compensaria a elevação da pressão aumentando o diâmetro dos vasos. A queda na
produção de óxido nítrico é grave, mas felizmente é parcialmente compensada
pela ingestão de nitratos e derivados. As quebras das fibras de elastina
ocorrem mesmo com a estabilidade dessas fibras se prolongando por uma vida
média de 40 anos. O problema então não se encontra no envelhecimento, e sim no
estresse pressórico recorrente sobre os vasos, que chega a aproximadamente 2
bilhões de expansões aórticas até a sexta década de vida. Um desgaste em que não
apenas a aorta está envolvida. Seus efeitos se aliam a modificações em vasos
periféricos, particularmente arteríolas e pequenas artérias, onde ocorre o fenômeno
denominado rarefação, que é a diminuição de vasos interconectados que
permitiriam uma maior fluidez na corrente sanguínea.
O sistema
renina-angiotensina-aldosterona, que em condições de hipotensão induzem
respectivamente vasoconstricção (renina-angiotensina) e retenção de sódio com
consequente retenção de água (aldosterona). Já em condições patológicas a antiotensina
II induz a uma inflamação vascular, fibrose cardíaca e renal, além da
associação com eventos ateroscleróticos.
A Hipertrofia Ventricular
Esquerda (HVE) é conjecturada como causa ou consequência da hipertensão
arterial. De qualquer forma é um fator seguramente associado, assim como também
foi associado o aumento da espessura do septo interventricular com a incidência
de hipertensão arterial. Outra associação ainda mais evidente é a ingesta de
sal. O estudo INTERSALT demonstrou a correlação direta entre a dieta
hipersódica e a hipertensão. Da mesma forma, outro estudo com os índios
Yanomames, identificou a ingesta hipossódica com incidência nula de hipertensão
arterial nessa população. Concluiui-se então que ingesta de sal acima de 100
mEq/dia associou-se a prevalência de hipertensão em 50% dos idosos acima de 60
anos, enquanto que a hipertensão é rara em indivíduos que ingerem até 50
mEq/dia.
TRATAMENTO NÃO MEDICAMENTOSO
O primeiro passo é a mudança de
hábitos nutricionais para aqueles pacientes em dieta hipersódica e
hipercalórica para idosos acima do peso recomendado para a idade. Exercícios
físicos funcionam tanto para prevenir a instalação da hipertensão, como para
reduzir os níveis pressóricos. Devem começar em ciclos de pequena duração e
intensidade, com o objetivo de condicionamento físico, e ir elevando a
dificuldade com a aquisição da boa condição física. A ingesta de sal deve se
restringir a 2,4 g de sódio ou 6 g de cloreto de sódio.
TRATAMENTO MEDICAMENTOSO
Primeiramente deve-se ater para a
introdução gradual dos medicamentos devido ao risco de hipotensão ortostática e
eventos isquêmicos, já que o efeito dos barorreceptores não possui mais a devida
respostacompensatória a mudanças de pressão. Se o paciente possui níveis
pressóricos muito elevados, o tratamento inicial não deve rebaixar os níveis
abaixo de 160 mmHg. Alguns pacientes, classificados como mais frágeis, tendem a
apresentar respostas indesejáveis, tais como perda de peso, sensação de
cansaço, fraqueza muscular e inapetência.
O estudo Val-Syst estabeleceu um
esquema inicial que bons resultados através da avaliação de 421 pacientes de 60
a 80 anos portadores de HSI por 24 semanas. A pressão sistólica identificada
foi estabelecida entre 160 e 220 mmHg. Radomizados, metade dos pacientes fez
uso de anlodipino 5 mg/dia e a outra metade fez uso de valsartana 80 mg/dia.
Essa primeira fase durou oito semanas. Caso a pressão sistólica não alcançasse
o patamar de 140 mmHg era adicionado o dobro da dose para os dois grupos de
pacientes, ou seja, 10 mg de anlodipino e 160 de valsartana. Daí passava-se
mais oito semanas. Para aqueles pacientes que não alcançavam o nível pressórico
de 140 mmHg mesmo assim, era adicionado hidroclorotiazida na dose de 12,5 mg. O
resultado foi que se alcançou a adequação da pressão arterial em 70% dos
pacientes.
O estudo ANB2, que comparou os
resultados de 6.083 hipertensos em uso de enalapril ou hidroclorotiazida,
concluiu que o enalapril se associou mais a eventos cardiovasculares e morte. O
enalapril tem apresentação em 5, 10 e 20 mg, com dose usual de 10 a 40 mg ao
dia, tomadas em duas administrações. A hidroclorotiazida pode ser utilizada até
100 mg/dia, mas no caso de idosos e principalmente nos casos e que há outro
hipertensivo associado, a dose inicial deve ser menor, com o paciente passando
por diversas reavaliações até que se encontre a dose adequada.
HIPOTENSÃO NO IDOSO (HO)
As maiores repercussões dessa
condição são síncopes e quedas, infarto agudo do miocárdio e acidentes
vasculares cerebrais. A prevalência da HO em idosos institucionalizados é de
30%. Quando a causa é neurogênica possui consequências mais incapacitantes.
Os sintomas começam com a mudança
de posição, mais comum pela manhã, após refeições de grande volume, exercícios
físicos e banho quente, todas levando a uma redistribuição anômala momentânea
da corrente sanguínea que ocasiona hipoperfusão cerebral. Daí segue-se tonteira,
síncope, quedas, distúrbios visuais, déficits neurológicos focais e
cervicoalgia.
Não há diagnóstico diferenciado
para o idoso em relação ao adulto jovem. É recomendado que a aferição seja
realizada na posição ortostática após 30 minutos de repouso em decúbito dorsal
no segundo minuto, realizando mais duas aferições repetidas a cada dez minutos.
Se for identificada uma queda de pressão na terceira aferição de ao menos 20
mmHg o diagnóstico é positivo.
Dito isso a HO pode ser
classificada em simpaticotônica, quando há aumento da frequência cardíaca
apropriada e aproximadamente 20 batimentos por minuto. Esse tipo geralmente
está associado ao idoso não praticante de exercícios físicos regulares; pode
ocorrer por disfunção autonômica, quando não ocorre
aumento de frequência cardíaca, ou ocorre um aumento de até 10 batimentos por
minuto; HO por distúrbio vagal, quando há diminuição da frequência
cardíaca. Nesse caso o problema é maior, pois haverá mal funcionamento do
sistema nervoso autônomo, com acometimento de fibras nervosas aferentes que
elevem as informações para exigir do corpo uma adaptação como resposta.
As causas básicas ainda podem ser
traduzidas em mais dois mecanismos fisiológicos: HO hiperadrenérgica,
causada por diminuição da volemia e por depleção de sódio por perda
gastrointestinal ou renal com secreção de aldosterona aquém do ideal; HO
hipoadrenérgica, quando há lesão no arco reflexo.
A HO hipoadrenérgica pode
ser: primária,
que é idiopática; ou secundária, mais comum, com
disfunção de múltiplos sistemas, podendo ser causada por alcoolismo, amiloidose e
principalmente por diabetes.
O idoso com a HO por distúrbio
vagal cursa com perda da libido, distúrbios de micturiçao e alterações dos
hábitos intestinais, como constipação ou diarreia. Rouquidão, obstrução nasal e
apnéia do sono também podem surgir. Portadores desse tipo de HO costumam ser
portadores de hipertensão grave e se manejados contra a HO em decúbito dorsal
por muito tempo podem agravar a hipertensão.
Dois mecanismos estão mais
envolvidos na HO. O primeiro é a não ativação dos barorreceptores que estão,
principalmente, na parede da carótida interna e do arco aórtico, que levariam
informações sobre quedas rápidas de pressão arterial até o bulbo. O segundo
mecanismo é a mesma disfunção, só que nos quimiorreceptores que se localizam na
bifurcação da carótida comum.
O primeiro passo para se tratar
essa condição é a retirada de fármacos que induzem o indivíduo à HO, tais como
os betabloqueadores, o antidepressivos e os antianginosos. Os pacientes em uso
de simpaticolíticos apresentam especial tendência à hipotensão ortostática
pós-prandial. Devido à maior secreção de fator natriurético esses pacientes
urinam muito à noite sem reporem o sal do organismo, já que não costumam se
alimentar. Em consequência a HO ocorre pela manhã quando o paciente se levanta.
Para evitar isso pode-se elevar a cabeceira da cama em 10 a 20 graus,
minimizando os desvios noturnos de líquido intersticial, mantendo o líquido
nesse espaço nas pernas, o que servirá
de reserva quando o paciente ficar de pé.
Caso o paciente não tenha
insufuciência cardíaca congestiva, deve-se parar com diuréticos e liberar a
ingesta de sal e vestir meias elásticas até a cintura apenas durante o dia. Isso
se alia ao levantar gradual pela manhã, não utilizar saunas, nem se expor ao
sol por demasiados períodos, além de evitar carregar pesos, que desviariam o
sangue para a área abdominal e intratorácica com consequente hipoperfusão
cerebral. O mesmo ocorre na hipotensão pós-prandial, agravada pela secreção de
histamina, bradicinina e adenosina por conta da resposta à ingesta alimentar. Esse
mecanismo pode ser diminuído pela simples ingesta de café após as refeições,
pois esse diminui a resposta à adenosina. Exercícios de natação são os mais
recomendados, pois debaixo d’água a pressão se mantém estável, demandando maior
cuidado apenas ao sair da água.
O tratamento farmacológico é
realizado com a 9-alfa-fluoridrocortisona, com dose inicial de 0,1 a 0,3
mg/dia, podendo chegar até 1 mg/dia, porém com aumentos graduais e adaptados
para a idade. Ela aumenta a retenção de sódio, aumento do volume sanguíneo e
aumento da sensibilidade dos vasos sanguíneos a vasopressores endógenos. A midodrina
tem efeito agonista periférico seletivo de receptores alfa-1-adrenérgico, é
rapidamente absorvida no trato gastrointestinal, tem início de efeito e 20 a 40
minutos e manutenção deste por 3 horas. A dose é de 10 mg via oral 3 vezes ao
dia, sendo que a última dose deve ser administrada até as 18 horas a fim de
evitar a hipertensão supina. Como estamos falando de idoso e como a resposta a
esses fármacos varia de indivíduo para indivíduo, a dose inicial é de 2,5 mg
via oral duas vezes ao dia.
REFERÊNCIAS
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