Antes de tudo
é importante compreender o que é a placenta. Então o endométrio gravídico é
chamado de decídua. Ela é dividida em decídua basal, que dará origem ao lado
fetal da placenta; decídua capsular é a porção que encobre o feto até a 22-24
semanas, quando se torna muito delgada e assim tem reduzido seu suprimento
sanguíneo, o que a faz desaparecer. Por fim há a decídua parietal, a porção
materna da placenta. Na maturação da placenta são formadas vilosidades
coriônicas, que é o conjunto formado entre citotrofoblasto, sinciciotrofoblasto
e mesoderma extraembrionário. Esse conjunto possui duas superfícies bem
diferentes, uma porção virada para o feto de superfície lisa chamada de córion
liso e uma porção com vilosidades voltada para o lado materno chamada de córion
frondoso ou viloso. Pois bem, a placenta é justamente o conjunto formado entre
o córion viloso e a decídua basal.
O DPP consiste
em desolamento da placenta de inserção normal depois da 20ª semana de gestação.
A incidência varia entre 1 a cada 75 a 225 nascimentos. O Óbito fetal pode
ocorrer principalmente quando outras condições estiverem associadas, a exemplo
do retardo do crescimento intra-uterino e parto prematuro. Na presença de
descolamento há nove vezes mais chances de haver morte fetal e quatro vezes
mais chances de haver parto prematuro.
Tudo começa
com rompimento de uma das 80 a 100 artérias espiraladas entre a decídua parietal
e a placenta, podendo ser pequeno e autolimitado ou pode crescer e dissecar
essas duas porções interrompendo os nutrientes e gases que passariam por esse
local até o feto. O posicionamento do hematoma que se forma pode ser dois: ou
pode se espalhar pela cavidade uterina na medida em que o descolamento cresce
até alcançar o colo uterino fazendo com que esse sangue se exteriorize
(hemorragia externa), ou pode não alcançar o colo e permanecer oculto – 20%
dos casos (hemorragia oculta). De qualquer forma esse descolamento não
advém de um único fator com exceção de traumas. Geralmente ocorrem má formações
vasculares com aumento da fragilidade dos vasos na interface placenta decídua,
inflamações agudas e placentação anômala, mas todos de período variável,
geralmente com início no primeiro trimestre no momento da invasão
trofoblástica.
Nas duas
ondas de invasão trofoblástica há degradação da camada muscular dos vasos para
que ocorra uma dilatação suficiente para suprir as necessidades fetais
gradativamente mais altas. Se o processo de aumento do calibre dos vasos não
ocorre de maneira adequada, assim como ocorre na DHEG, a oxigenação das porções
internas ficam deficientes e por isso essas estruturas tornam-se mais frágeis.
Como há uma divisão estrutural entre a decídua parietal e a placenta esse será
o local do descolamento.
Como a
invasão trofoblástica se constitui num ponto em comum com o DPP e as condições
hipertensivas da gestação, as síndromes hipertensivas da gestação serão os
maiores fatores de associação. No estudo de Pritchard dentre 192 gestantes com
DPP 89 eram hipertensas. Outros fatores de risco são a multiparidade, gestação
múltipla, tabagismo, trauma, uso de cocaína ou trombofilias hereditárias.
A cesárea
prévia também é associada como fator de risco porque a perfusão no local da
cicatriz incisional uterina não há perfusão semelhante ao período anterior ao
parto. Apesar disso, um estudo na clínica obstétrica do HC-FMUSP não confirmou
esse achado. Quanto à ruptura prematura de placenta pode ser uma causa ou
consequência. Sabe-se que com o descolamento há aumento de trombina tecidual,
que leva ao aumento das proteases, enfraquecendo as membranas frente a pressão
intrauterina.
Tombofilias
estão associadas quando são múltiplas. Estão relacionadas as deficiências na
Proteína C, S e antitrombina, além da elevação dos fatores de coagulação VII,
VIII, IX e XI. Quanto mais componentes estiverem comprometidos, maiores serão
as chances de rompimento dos vasos e o DPP. Desses componentes o mais associado
é a antitrombina. Para o uso da cocaína, 10% das usuárias apresentam o DPP por
conta da vasoconstrição dos vasos da interface placenta-decídua, assim como
ocorre com o tabagismo. Sobre esse
último, mulheres com volume de consumo de cigarros diários entre 10 a19 possuem
40% mais chances de apresentar o DPP. Já o trauma, o único que pode ser causa
isolada, pode levar ao descolamento num período de 24 horas após o evento
desencadeante.
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico
será dado, na maioria das vezes, pela história e exame físico. Os sinais e
sintomas clássicos são sangramento via vaginal, dor abdominal súbita e intensa,
dor abdominal à palpação, taquisistolia e hipertonia. Se a paciente apresenta
os sinais, só que mais intensos e sem sangramento, interpreta-se a evolução
como sangramento oculto severo podendo ainda haver infiltração de sangue na
serosa do útero e criando a condição denominada útero de Couvelaire, quando o
útero encontra-se equimosado e sem contralidade. Pode-se encontrar ainda
dificuldade da ausculta dos batimentos fetais, aumento progressivo da altura
uterina e bolsa das águas tensa ao toque vaginal.
No exame
geral pode-se encontrar a pressão arterial convergente, com diferença entre
sistólica e diastólica no máximo de 20 mmHg. Na pele podem surgir sinais de
coagulopatias (coagulação intravascular disseminada), tais como petéquias,
equimoses ou hematomas. A gestante pode ir a óbito tanto pela coagulação
disseminada, como também pela perda de volume sanguíneo.
Apresentações
mais incomuns e mais brandas ocorrem com pequeno e interrupto sangramento e sem
hipertonia. Nesses casos o descolamento é parcial e chamado de descolamento
prematuro de placenta crônico, que apesar de mais brando, quando ocorrido no
segundo trimestre provém um prognóstico ruim ao feto. Zugaib cita dois estudos
onde de 15 gestações com essa condição, apenas dois fetos sobreviveram.
Em 10 a 20%
dos casos as gestantes evoluem com coagulação intravascular disseminada,
normalmente com o feto já morto. O evento relevante aqui é a queda da fibrina,
ocorrida com a tentativa do organismo de conter o sangramento, enquanto a bolsa
de sangue dilui a fibrina e fragiliza sua capacidade de tamponar os vasos
abertos. Como a quantidade de fibrina dirigida ao útero é grande na medida em
que vai se depositando, porções de fibrina ativadas também se soltam e podem ir
parar em outros órgãos, por exemplo na íris, onde os vasos possuem pequeno
calibre. Ocorre ainda que no processo de lesão tecidual o organismo libera
tromboplastina, que termina por cair na corrente sanguínea materna e induz a
coagulação dos seus capilares.
Quando o
descolamento se sucede a um trauma normalmente a atividade uterina irá
aumentar, exigindo um monitoramento fetal frequente por 24 horas, período em
que o descolamento costuma ocorrer após o evento desencadeante. Caso até a
sexta hora não houver perda de conteúdo uterino, aumento das contrações, dor a
palpação e o padrão cardíaco fetal se mantiver entre 120 e 160, não haverá mais
necessidade de avaliações. Alguns autores sugerem a tomografia computadorizada
com contraste para definir o DPP na mulher com clínica sugestiva.
O uso da
ultrassonografia é indicado apenas para os casos duvidosos, pois nos
sangramentos agudos o hematoma tem ecogenicidade semelhante à placenta, dando a
impressão de espessamento desta em vez do sangramento em si. Apenas após duas
semanas o hematoma torna-se anecoico e de boa visualização pelo aparelho de
ultrassom. Nesse período se o sangramento é pré-placentário não haverá
repercussões clínicas, mas se for retroplacentário terá um índice de
mortalidade fetal de 50%.
CONDUTA
1-
Monitoramento materno constante com aferição da
TA, frequência cardíaca e débito urinário, que deve estar no mínimo de 30 ml/h.
Realiza-se os exames para pesquisa de coagulopatias, como tempo de
tromboplastina parcial ativada (TTPA), concentração de fibrinogênio, tempo de
tromboplastina, dímero D. Além disso, também solicita-se o hemograma completo
para avaliação de hematócrito e plaquetas. Se o fibrinogênio não puder ser
dosado pode-se fazer uma coleta de sangue num tubo de ensaio que deverá ser
submetido a movimentos verticais e horizontais suaves por 10 minutos. Se coágulos
não se formarem em até cinco a dez minutos de teste tem-se sugestão de queda de
plaquetas e fibrina.
2-
Acesso venoso, sondagem vesical e
oxigenoterapia.
3-
Infusão de expansores de volume se existir
sinais de choque hipovolêmico. Se os valores hemantimétricos estiverem baixos
pode solicitar transfusão sanguínea, com o objetivo de manter o hematócrico
acima de 30%.
4-
Se feto viável acima de 26 semanas com sangramento
incontrolável a conduta é realizar parto cesáreo. Se houver dilatação cervical,
este estará ocorrendo por aumento da pressão amniótica, exigindo amniotomia e
encaminhamento ao parto. Isso irá reduzir as chances da entrada de fibrina na
corrente sanguínea e invasão de sangue na serosa com formação do útero de
Couvelaire. Caso esta condição ocorrer há chance de necessidade de
histerectomia para parar a hemorragia.
5-
Se o feto for inviável a conduta segue as
condições maternas. Se estiverem satisfatórias realiza-se a amniotomia e
indução do parto com ocitocina. Se não, na presença de hipovolemia, anemia e
hipoxemia, o parto cesáreo deve ser realizado.
REFERÊNCIAS
ZUGAIB, Marcelo. Obstetrícia.
2 ed. Barueri. Manole, 2012.
Desenvolvimento
humano. Disponível em: http://www.ufrgs.br/livrodeembrio/ppts/5.desenvhumano.pdf.
Bacellar A, Longo A. Descolamento prematuro de placenta. Projeto Diretrizes. Disponível em: http://www.bibliomed.com.br/diretrizes/pdf/descolamento_placenta.pdf.
Bacellar A, Longo A. Descolamento prematuro de placenta. Projeto Diretrizes. Disponível em: http://www.bibliomed.com.br/diretrizes/pdf/descolamento_placenta.pdf.