ESTRUTURAS ANATÔMICAS ENVOLVIDAS NA AUDIÇÃO E NO EQUILÍBRIO
A orelha, também chamada de órgão
vestibulococlear, é dividida em porção externa, média e interna, possuindo duas
funções: audição e equilíbrio. A membrana timpânica é o limite entre a porção
externa e a média. Nessa porção externa a orelha capta o som e o meato acústico
externo o conduz até as porções internas. A pele que o recobre é contínua com a
lâmina externa do tímpano, uma membrana que limita a porção externa da cavidade
timpânica, onde estão os ossículos responsáveis pela audição: o martelo, a
bigorna e o estribo. O tímpano possui uma concavidade, com o ápice sendo
denominado umbigo da membrana timpânica. A organização do tímpano e do
seu eixo é específica para funcionar como um receptor de sinais do solo, da
frente e das laterais do indivíduo. Se observada através de otoscópio ela
possui um local de maior reflexo de luminosidade, o cone de luz, existente por
conta da maior concentração de fibras elásticas. Possui inervação de três
nervos distintos: a face externa pelo auriculotemporal (ramo do quinto nervo
craniano), a face interna pelo glossofarígeo, e pouca inervação também é
suprida pelo vago.
A membrana timpânica vibra com a
chegada dos sons e seus movimentos acabam sendo passados para os ossículos da
audição. Essa vibração é passada para o martelo, que movimenta a bigorna, que
movimenta o estribo. O interessante é que como a área da membrana é maior que a
do estribo, a vibração nesse é 22 vezes maior. Para se ter uma ideia melhor, a
largura média do estribo é de 3,2 mm, enquanto que o do tímpano é 55. Isso é necessário porque, sendo o estribo
maior, a membrana não resistiria à tensão necessária para tracionar o líquido
dentro da cóclea, sendo que dessa forma ela se partiria.
A orelha média está conectada com a porção nasal da faringe, a tuba
auditiva e com as células mastoideas pelo antro mastoide, um canal que dá
passagem para o nervo facial. É composta por: ossículos da audição, músculos estapédio
e tensor do tímpano, plexo nervoso timpânico e corda do tímpano.
A conexão com a faringe se faz no
meato inferior da cavidade nasal, tendo ambas as estruturas a mesma túnica
mucosa. Por essa informação pode-se perceber porque a pressão da orelha média é
a mesma da atmosfera, o que permite que os movimentos da membrana timpânica
sejam livres. Dois músculos do palato mole vão abrir a entrada para esta
porção: o tensor do véu palatino e o levantador do véu palatino. Eles estarão oposicionando
as paredes da tuba auditiva e por isso quando há uma diferença de pressão entre
a atmosfera e a tuba auditiva, o ato de bocejar ou deglutir distende esses
músculos e cria uma passagem com o nariz, aliviando o incômodo consequente.
Os ossículos da audição ocupam da
membrana timpânica até a janela do vestíbulo, local de acomodamento do estribo
e também onde há uma abertura oval que conduz à orelha interna, o forame oval.
O martelo se fixa na membrana timpânica e o estribo nos ligamentos adjacentes
ao forame oval. A bigorna está entre os dois e a eles articulada. O martelo fica
ligado à ponta do umbigo da membrana timpânica através de seu promontório. A
bigorna fica no recesso epitimpânico e se articula de um lado com a cabeça do
martelo e do outro com o estribo.
O músculo tensor do tímpano
citado anteriormente nasce da asa maior do esfenoide e na parte petrosa do
temporal para se inserir no martelo e possibilitar o tracionamento da membrana
timpânica para reduzir a amplitude de suas vibrações e assim evitar danos por sons
intensos. Esse é o mesmo efeito da atividade do músculo estapédio, só que esse
se insere no estribo, tracionando-o para trás. Quando um som intenso chega à
membrana timpânica geralmente ocorre um período de latência de 40 a 80
milissegundos, com o tensor do tímpano contraído e o estapédio também, só que
esse em menor grau. Como esses dois músculos irão se contrair contra o
movimento vibratório da estrutura de onde se inserem, servirão como
estabilizadores. Outra função desse processo todo é que como há redução de
frequência, torna possível que a pessoa se concentre em um som no meio de
ruídos, ou distinguir o som de um instrumento musical entre vários.
A orelha interna é onde existe o órgão vestibulococlear propriamente dito. Além de ser o captador dos estímulos sonoros, é também responsável pelo equilíbrio. Ela fica inserida na parte petrosa do temporal e possui o labirinto ósseo que contém o labirinto membranáceo que fica suspenso pela perilinfa e contendo a endolinfa.
O labirinto ósseo é composto
pelos canais semicirculares, vestíbulo e cóclea. A cóclea é envolvida com a
audição pelo seu ducto coclear. A cóclea possui um centro denominado modíolo,
ao qual a cóclea dá 2,5 voltas em seu entorno, e onde estão os canais para a
distribuição do nervo coclear. O vestíbulo é contínuo com a parte óssea da
cóclea, mas se comunica também com os canais semicirculares, que são em número
de três: anterior, posterior e lateral. Situados dentro deles estão os ductos
semicirculares, uma estrutura membranácea que na realidade é um conjunto de
sacos e ductos que comunicam entre si, com capilares sanguíneos formadores de
endolinfa. Por vezes essa endolinfa é fabricada em excesso e por isso existe
uma estrutura chamada de saco endolinfático, que funciona como um reservatório.
O vestíbulo contém o sáculo e o utrículo, que possuem epitélio sensitivo, as
máculas, estruturas contenedoras de cílios inervados pelo nervo
vestibulococlear.
Os ductos semicirculares são três
e estão em ângulo reto entre si. Cada ducto semicircular contém uma estrutura dilatada
chamada ampola, a qual possui uma área sensitiva, a crista ampular, que capta
os movimentos da endolinfa quando há movimentação do crânio através de células
ciliadas altamente diferenciadas. Recobrindo a crista existe uma estrutura
mucopolissacarídea que é deformada pelos movimentos da endolinfa. As células
ciliadas da crista ampular podem ser de dois tipos: o tipo 1 tem formato
arredondado e possui diversas terminações nervosas, enquanto que o tipo 2
possui formato cilíndrico e possui apenas uma terminação nervosa. Uma
semelhança importante entre essas células é a presença do cinocílio, descrito
mais tarde.
O canal espiral da cóclea está
cheio de perilinfa e é dividido pelo ducto coclear em dois canais no ápice da
cóclea – local denominado helicotrema – por onde os pulsos de pressão
hidráulica passam para a rampa timpânica. Esse local merece destaque por ser
justamente onde os impulsos hidráulicos se transformam novamente em vibrações. O
papel de divisor do ducto coclear se faz por meio de duas membranas: de
Reissner e basilar, o que termina por criar as três porções chamadas de rampas,
que são a rampa vestibular e a rampa média, as quais são separadas por uma
membrana extremamente fina – membrana de Reissner. Por fim também há a rampa
timpânica, separada da rampa média pela membrana basilar, onde está contido o
órgão de Corti, estrutura receptora de estímulos auditivos por conter cílios. Fica
ainda abaixo de uma membrana especial, a tectórica, que serve de fixação da
parte superior dos cílios do órgão de Corti.
Na detecção da posição e movimentação
da cabeça o vestíbulo tem papel de integrar informações que vem dos canais
semicirculares e do labirinto membranáceo da cóclea. Os canais semicirculares
são responsáveis pela mensuração de aceleração da cabeça ou do corpo. Cada
ducto percebe apenas o eixo perpendicular à sua posição. Quando um par
funcional, ou seja, o mesmo ducto de ambos os lados, é excitado, ele inibe ou
outros dois. No movimento circular mais de um par é excitado. Nesse mesmo
movimento rotatório a velocidade da endolinfa de todos os ductos se iguala, só
que no sentido inverso. Quando o indivíduo roda e para de vez a inércia
continua a movimentar a endolinfa e assim os cílios, o que dá a informação
falsa de movimento.
O OUVIR
Quando o som passa pelo ouvido
externo, se transmite para os ossículos, para o vestíbulo e por fim para a
cóclea, o distúrbio na perilinfa comanda outro distúrbio na membrana basilar.
Esta membrana é fixa na parte central da cóclea, mas é livre na porção distal,
o que possibilita sua vibração.
Ao mesmo tempo que uma porção da
perilinfa é jogada para a frente através da janela oval, uma parte é
extravasada pela janela redonda, pois a cóclea é delimitada por ossos e por
isso haveria de existir uma via de escape. Esse movimento da perilinfa faz com
que a membrana basilar também se curve na direção da janela redonda quando o
líquido extravasa por ela, e o movimento de retorno causado pelas fibras
basilares é justamente o que propaga o distúrbio da perilinfa de volta para a
cóclea.
Os distúrbios da perilinfa
terminam por estimular algum dos 100 cílios que existem em cada célula ciliada.
A estimulação ocorre por causa da mudança de posição dos cílios, que abrem 200
a 300 canais de cátions permitindo a passagem de íons potássio para a célula, o
que despolariza sua membrana. Esses íons potássio são advindos da endolinfa,
cuja concentração é alta, e juntamente com os níveis baixos de sódio
diferenciam esse líquido do cefalorraquidiano, o que não ocorre com a
perilinfa, que é praticamente igual. Essa despolarização é que vai estimular as
terminações do nervo coclear pela liberação de algum neurotransmissor,
possivelmente o glutamato.
Essa despolarização é seguida de hiperpolarização. Quem dá o sinal para a repolarização da célula é a orientação dos cílios, ou estereocílios, sobre outro cílio único, o cinocílio. Cada célula ciliar possui sempre esse cinocílio em sua extremidade, e todos os estereocílios que se seguem diminuem de tamanho gradativamente. Enfim, se a perturbação da célula ciliar joga os estereocílios sobre o cinocílio, o resultado é despolarização. Caso a perturbação jogue o cinocílio sobre os estereocílios ocorre hierpolarização, com redução de neurotransmissores e assim menor excitação das fibras aferentes. Essa é a lei de Ewald, que explica porque um canal semicircular inibe o outro.
Uma característica interessante
das fibras da membrana basilar é serem mais elásticas perto da janela oval e
mais maleáveis ao longo da membrana. Isso se equilibra com o padrão de vibração
dos sons de alta a baixa frequência, pois os de alta frequência produzem
ondulações perto da janela oval e se dissipariam caso as fibras fossem rígidas
em todo o seu trajeto. Os sons de alta frequência vibram as porções mais distais
da membrana basilar. Nos dois casos a rigidez das fibras basilares compensam a
energia perdida com a propagação da onda, pois as de alta frequência vibram nas
primeiras porções, mas o impulso continua por conta da maleabilidade
progressivamente mais alta das mesmas. Os sons de baixa frequência viajam uma
distância maior para começar a vibrar as fibras e por isso perdem energia, mas
como esse local de início é mais maleável, elas são suficientes para produzir
estímulos.
O órgão de Corti vai receber
essas vibrações para produzir o estímulo nervoso. Isso ocorre por meio dos
cílios, que tem organizações diferentes nas porções mais externas e internas.
Nas porções internas os cílios estão dispostos em fila única, em número
aproximado de 3.500, com diâmetros de 12 micrômetros, enquanto os cílios
externos estão dispostos em 3 ou 4 fileiras, com cílios de 8 micrômetros. O
número da porção interna é menor, mas elas se ligam com 90 a 95% das
terminações nervosas. Essas terminações levam os impulsos ao gânglio espiral de
Corti, no modíolo. Este, por sua vez envia o impulso por axônios para o nervo
coclear e daí para o SNC na parte superior do bulbo.
É interessante notar que também
existem fibras nervosas que vem do tronco cerebral para os cílios, porém sua
função é distinta dos anteriormente citados. Essas fibras nervosas vão até as
vizinhanças dos cílios e comandam variação da sua rigidez, pois quanto mais
rígidos, maior é a propagação do som. Isso permite uma adaptação dessas
estruturas para os diferentes tons e possibilita a ausculta de sons discretos.
A parte superior do bulbo é o
local de destino das fibras que saem da cóclea. As fibras em questão se
direcionam para o núcleo olivar superior, onde a maior parte decursam. Vão
então pelo leminisco lateral ou para o colículo inferior. O próximo passo é o
núcleo geniculado medial e por fim migram para o córtex auditivo, localizado no
giro superior do lobo temporal. Curioso é o fato de que a maioria das fibras
advindas dos dois ouvidos decursam. Além disso, muitas delas também terminam no
núcleo reticular ativador do tronco cerebral, o que possibilita respostas a
sons intensos.
REFERÊNCIAS
GUYTON, Arthur C.; HALL,
John E. Tratado de fisiologia
médica. ed 12. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011;
MOORE, Keith L.; DALLEY, Arthur F. Anatomia
Orientada para a Clínica. 4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;
MACHADO, Ângelo. Neuroanatomia funcional. Ed 2. São
Paulo: editora Atheneu, 2000;
QUEIROZ, Gabriela A. de Souza. Fisiologia vestibular. Disponível em http://www.forl.org.br/pdf/seminarios/seminario_33.pdf,
acessado em 12 de dezembro de 2012 às 14:00.
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