domingo, 18 de novembro de 2012

LESÕES ESOFÁGICAS



ANATOMIA E HISTOLOGIA  DO ESÔFAGO
O esôfago é um espaço virtual de aproximadamente 25 centímetros que não possui a camada serosa. Sua divisão de camadas fica restrita a mucosa, submucosa e muscular externa. Existem ilhas de mucosa gástrica isoladas em todo o esôfago, embasando a preferência do uso de tecidos do estômago para correções na área. Ele está preso ao diafragma por meio do ligamento frênico esofágico, mas apesar disso o movimento respiratório não demanda contrações no esôfago quando há contrações no diafragma, por isso possibilitando felizmente que a deglutição seja independente da respiração, pois, do contrário, a aspiração seria frequente durante o ato de deglutir.
A mucosa é dividida em epitélio, lâmina própria e muscular da mucosa. O epitélio aqui é pavimentoso estratificado não queratinizado, tendo uma espessura de 0,5mm. Sua importância no âmbito de mecanismo de defesa se faz por possuir as células de Langerhans, que fagocitam antígenos e os quebram em partículas polipeptídicas, os epítopos. Esses epítopos são unidos a moléculas do complexo de histocompatibilidade (MHC) e é externado para o plasmalema. Quando essas células migrarem para os linfonodos, elas exercerão seu poder de apresentação de antígenos. Já a lâmina própria possui as glândulas cárdicas, que produzem um muco que protege o esófago dos atritos ocasionados pelo bolo alimentar.
A submucosa do esôfago é a porção mais resistente. Possui atividade imunitária, e seus dois tipos de células, serosas e mucosas, produzem o pepsinogênio, cujo princípio ativo antibacteriano é a lisozima. Essa porção também possuem glândulas produtoras de mucina, uma glicoproteína com poder de proteção contra o contato com o ácido clorídrico do estômago.
A muscular externa possui fibras musculares nos sentidos longitudinais e circulares no transversal, cujo objetivo é promover o peristaltismo através de movimentos de constrição e relaxamento sincronizados, que ainda podem ser de três tipos: peristalse primária, a qual se inicia com a deglutição; peristalse secundária ocorre por conta da dilatação das fibras musculares ou irritação da mucosa, tendo ação propelente sobre o bolo alimentar; peristalses terciárias são contrações não progressivas sem momento definido para ocorrer, ou seja, estão presentes depois da deglutição ou espontaneamente. Por entre as camadas circulares e longitudinais se encontra o plexo de Auerbach, que se estende pelo restante do trato gastrointestinal, sendo o responsável pelo estímulo elétrico dos movimentos peristálticos.
Conforme a profundidade do esôfago há perda do controle consciente de suas fibras, sendo esse fato reflexo da troca de fibras esqueléticas predominantes no terço superior e lisas predominantes no terço inferior.
O esôfago possui quatro constrições.
  • 1.       Esfíncter esofágico superior, que fica em torno de 15 cm dos dentes incisivos;
  • 2.       Na altura do arco da aorta;
  • 3.       Na altura do brônquio principal esquerdo;
  • 4.       No esfíncter esofágico inferior.

A margem direita é contínua com a curvatura menor do estômago, mas a margem esquerda é separada do fundo pela incisura cárdica. O limite entre o esôfago e o estômago fica nessa região, na linha Z, mesmo local onde a musculatura do diafragma funciona como um esfíncter fisiológico, e também onde há mudança de células escamosas para cilíndricas.
Esse esfíncter fisiológico na porção inferior faz parte da Zona de Alta pressão Esofágica Distal, apresentando geralmente uma área de 3 a 5 cm de comprimento e 10 a 20 mmHg de pressão. É interessante notar que refluxo gastro-esofágico não tem relação determinante com essa tensão tecidual, pois há pessoas que possuem pressões mais baixas e não apresentam o problema e pessoas acometidas que por vezes apresentam níveis elevados. Mesmo assim é certa a relação entre esse refluxo e pressões abaixo de 6 mmHg.
A drenagem sanguínea se faz para a veia gástrica e para as veias esofágicas, ambas componentes do sistema ázigo. O suprimento se faz pelas artérias gástricas e pela frênica inferior esquerda. A drenagem gástrica vai para os linfonodos esquerdos e posteriormente para os celíacos, sendo nesse ponto onde as células de Langerhans entram para apresentar seus antígenos.

LESÕES ESOFÁGICAS
A deglutição de produtos cáusticos, no geral, é de natureza acidental nos casos envolvendo crianças, e de intensão suicida quando envolve mulheres. Os casos acidentais costumam ser de menor gravidade, pois com a sensação dolorosa a ingesta é interrompida. O acidente causado por substâncias sólidas, cuja aparência se assemelha com torrões de açúcar – como o hidróxido de sódio em escamas – costuma ser mais grave.
As lesões pelas substâncias cáusticas podem ocasionar extensões de três graus: 1° grau, com limitação à mucosa, sem formação de cicatriz; 2° grau, lesão com exposição de musculatura; 3° grau, lesão de todas as camadas, chegando ao estômago, podendo evoluir para peritonite, mediastinite, ou até mesmo lesões em órgãos vizinhos.
As lesões evoluem num período de aproximadamente 48 horas após ingestão. Lesões superficiais podem se recuperar em seis semanas, enquanto as profundas, que por sinal é facilitado pela ausência da camada serosa, se recuperam após meses, refletindo a dificuldade no processo de cicatrização.
Os agentes alcalinos vão causar lesões quando o PH for maior que 11,5. São mais lesivos em relação aos ácidos por causarem saponificação dos fosfolipídeos e proteínas das mucosas, com consequente morte imediata da célula. Infelizmente a massa resultante das células mortas não é barreira para o produto, não impedindo que as células mais profundas também sejam lesionadas ocasionando perfuração. Quando o agente é solido, sua disseminação é limitada, sendo mais profundos, porém menos extensas e por isso causando lesões menos graves.
A necrose causada pelos álcalis é de liquefação, com degeneração e morte celular após trombose dos vasos, cursando com invasão de bactérias e leucócitos. Possui ainda três fases: a primeira diz respeito a essa liquefação, indo até o quinto dia; a segunda fase é a reparadora, ocorrendo granulação do tecido, com início de deposição de colágeno, indo do quinto dia até vários meses. Nessa fase ocorre também a reepitelização, que pode se estender por trinta dias caso a submucosa não seja comprometida. Quando sim, a reepitelização pode perdurar por mais de 120 dias. A terceira fase se caracteriza pelo depósito de colágeno, com fibrose e estenose do esôfago.
A perfuração citada não ocorre quando o agente é ácido por duas razões: primeiro porque o PH do esôfago é alcalino, e segundo, por causar necrose de coagulação, terminando por formar uma escara protetora, barrando o avanço das porções ácidas que não entraram em contato com a submucosa nos primeiros momentos. Interessante notar que no esôfago, a lesão ocasionada por esses ácidos são menos graves em relação aos álcalis, evento esse não ocorrido no estômago, pois a presença do ácido estomacal não neutraliza o ácido ingerido, além da contração pilórica que leva a maior concentração do ácido no antro. Lembre-se: ácido não neutraliza ácido.
Os principais sintomas são sensação de queimadura, dor retroesternal, edema de lábios, boca e faringe, hematêmese e sialorréia por impossibilidade de engolir saliva. Quando a lesão corrosiva causa estenose do esôfago, os sintomas só aparecem meses depois. Esses sintomas englobam disfagia. Se acaso houver aspiração, o paciente pode evoluir para edema de laringe, e ainda para insuficiência respiratória.
Quando o acidente envolve pilhas, 90% não ocorrem nenhum evento lesivo. Quando esse ocorre, pode ocasionar perfuração do esôfago, com formação de fístulas para a traqueia e para o arco aórtico, cuja evolução é fatal. Essas lesões podem ocorrer por três mecanismos: descarga elétrica, vazamento de produtos alcalinos altamente concentrados, e necrose por impedimento do fluxo sanguíneo. Na maioria dos casos de lesões pelos agentes corrosivos, o indivíduo apresenta disfagia, sialorréia, inapetência.
As lesões corrosivas de diversas origens têm um problema em comum, que é o depósito exacerbado de fibrose, podendo ocorrer estenose tardia – até mesmo 50 anos depois – com potencial para carcinogênese.
As lesões esofágicas em geral possuem três fases, tendo variações de sintomas na primeira fase; de latência na segunda; e instalação de estenose na terceira, esta tendo relato de casos de ocorrência de até décadas após a ingestão do agente agressor.

REFERÊNCIAS
CORSI, P. R.; HOYOS, S. Rasslan; VIANA, A. de T.; GAGLIARD, T. Lesão aguda esôfago-gástrica causada por agente químico. Revista da associação médica brasileira. vol. 46. n. 2. São Paulo, abr-jun, 2000;

MOORE, Keith L.; DALLEY, Arthur F. Anatomia Orientada para a Clínica. 4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001;

GARTNER, Leslie P.; HIATT, James L. Tratado de histologia: em cores. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2003;

COELHO, Júlio Cézar Uili. Aparelho digestivo. vol. 2. Editora Medsi. Rio de Janeiro, 1996. 


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