ANATOMIA E HISTOLOGIA DO ESÔFAGO
O esôfago é um espaço virtual de
aproximadamente 25 centímetros que não possui a camada serosa. Sua divisão de
camadas fica restrita a mucosa, submucosa e muscular externa. Existem ilhas de
mucosa gástrica isoladas em todo o esôfago, embasando a preferência do uso de
tecidos do estômago para correções na área. Ele está preso ao diafragma por
meio do ligamento frênico esofágico, mas apesar disso o movimento respiratório
não demanda contrações no esôfago quando há contrações no diafragma, por isso
possibilitando felizmente que a deglutição seja independente da respiração,
pois, do contrário, a aspiração seria frequente durante o ato de deglutir.
A mucosa é dividida em epitélio,
lâmina própria e muscular da mucosa. O epitélio aqui é pavimentoso
estratificado não queratinizado, tendo uma espessura de 0,5mm. Sua importância
no âmbito de mecanismo de defesa se faz por possuir as células de Langerhans,
que fagocitam antígenos e os quebram em partículas polipeptídicas, os epítopos.
Esses epítopos são unidos a moléculas do complexo de histocompatibilidade (MHC)
e é externado para o plasmalema. Quando essas células migrarem para os
linfonodos, elas exercerão seu poder de apresentação de antígenos. Já a lâmina
própria possui as glândulas cárdicas, que produzem um muco que protege o
esófago dos atritos ocasionados pelo bolo alimentar.
A submucosa do esôfago é a porção
mais resistente. Possui atividade imunitária, e seus dois tipos de células,
serosas e mucosas, produzem o pepsinogênio, cujo princípio ativo antibacteriano
é a lisozima. Essa porção também possuem glândulas produtoras de mucina, uma
glicoproteína com poder de proteção contra o contato com o ácido clorídrico do
estômago.
A muscular externa possui fibras
musculares nos sentidos longitudinais e circulares no transversal, cujo objetivo
é promover o peristaltismo através de movimentos de constrição e relaxamento sincronizados,
que ainda podem ser de três tipos: peristalse primária, a qual se inicia com a
deglutição; peristalse secundária ocorre por conta da dilatação das fibras
musculares ou irritação da mucosa, tendo ação propelente sobre o bolo
alimentar; peristalses terciárias são contrações não progressivas sem momento
definido para ocorrer, ou seja, estão presentes depois da deglutição ou
espontaneamente. Por entre as camadas circulares e longitudinais se encontra o
plexo de Auerbach, que se estende pelo restante do trato gastrointestinal,
sendo o responsável pelo estímulo elétrico dos movimentos peristálticos.
Conforme a profundidade do
esôfago há perda do controle consciente de suas fibras, sendo esse fato reflexo
da troca de fibras esqueléticas predominantes no terço superior e lisas
predominantes no terço inferior.
O esôfago possui quatro
constrições.
- 1. Esfíncter
esofágico superior, que fica em torno de 15 cm dos dentes incisivos;
- 2. Na
altura do arco da aorta;
- 3. Na
altura do brônquio principal esquerdo;
- 4. No
esfíncter esofágico inferior.
A margem direita é contínua com a
curvatura menor do estômago, mas a margem esquerda é separada do fundo pela
incisura cárdica. O limite entre o esôfago e o estômago fica nessa região, na
linha Z, mesmo local onde a musculatura do diafragma funciona como um esfíncter
fisiológico, e também onde há mudança de células escamosas para cilíndricas.
Esse esfíncter fisiológico na
porção inferior faz parte da Zona de Alta pressão Esofágica Distal,
apresentando geralmente uma área de 3 a 5 cm de comprimento e 10 a 20 mmHg de
pressão. É interessante notar que refluxo gastro-esofágico não tem relação
determinante com essa tensão tecidual, pois há pessoas que possuem pressões
mais baixas e não apresentam o problema e pessoas acometidas que por vezes
apresentam níveis elevados. Mesmo assim é certa a relação entre esse refluxo e
pressões abaixo de 6 mmHg.
A drenagem sanguínea se faz para
a veia gástrica e para as veias esofágicas, ambas componentes do sistema ázigo.
O suprimento se faz pelas artérias gástricas e pela frênica inferior esquerda.
A drenagem gástrica vai para os linfonodos esquerdos e posteriormente para os
celíacos, sendo nesse ponto onde as células de Langerhans entram para
apresentar seus antígenos.
LESÕES ESOFÁGICAS
A deglutição de produtos
cáusticos, no geral, é de natureza acidental nos casos envolvendo crianças, e
de intensão suicida quando envolve mulheres. Os casos acidentais costumam ser
de menor gravidade, pois com a sensação dolorosa a ingesta é interrompida. O
acidente causado por substâncias sólidas, cuja aparência se assemelha com
torrões de açúcar – como o hidróxido de sódio em escamas – costuma ser mais
grave.
As lesões pelas substâncias
cáusticas podem ocasionar extensões de três graus: 1° grau, com limitação à
mucosa, sem formação de cicatriz; 2° grau, lesão com exposição de musculatura;
3° grau, lesão de todas as camadas, chegando ao estômago, podendo evoluir para
peritonite, mediastinite, ou até mesmo lesões em órgãos vizinhos.
As lesões evoluem num período de
aproximadamente 48 horas após ingestão. Lesões superficiais podem se recuperar
em seis semanas, enquanto as profundas, que por sinal é facilitado pela
ausência da camada serosa, se recuperam após meses, refletindo a dificuldade no
processo de cicatrização.
Os agentes alcalinos vão causar
lesões quando o PH for maior que 11,5. São mais lesivos em relação aos ácidos
por causarem saponificação dos fosfolipídeos e proteínas das mucosas, com
consequente morte imediata da célula. Infelizmente a massa resultante das
células mortas não é barreira para o produto, não impedindo que as células mais
profundas também sejam lesionadas ocasionando perfuração. Quando o agente é
solido, sua disseminação é limitada, sendo mais profundos, porém menos extensas
e por isso causando lesões menos graves.
A necrose causada pelos álcalis é
de liquefação, com degeneração e morte celular após trombose dos vasos,
cursando com invasão de bactérias e leucócitos. Possui ainda três fases: a
primeira diz respeito a essa liquefação, indo até o quinto dia; a segunda fase
é a reparadora, ocorrendo granulação do tecido, com início de deposição de
colágeno, indo do quinto dia até vários meses. Nessa fase ocorre também a
reepitelização, que pode se estender por trinta dias caso a submucosa não seja
comprometida. Quando sim, a reepitelização pode perdurar por mais de 120 dias.
A terceira fase se caracteriza pelo depósito de colágeno, com fibrose e
estenose do esôfago.
A perfuração citada não ocorre
quando o agente é ácido por duas razões: primeiro porque o PH do esôfago é
alcalino, e segundo, por causar necrose de coagulação, terminando por formar uma
escara protetora, barrando o avanço das porções ácidas que não entraram em
contato com a submucosa nos primeiros momentos. Interessante notar que no
esôfago, a lesão ocasionada por esses ácidos são menos graves em relação aos
álcalis, evento esse não ocorrido no estômago, pois a presença do ácido
estomacal não neutraliza o ácido ingerido, além da contração pilórica que leva
a maior concentração do ácido no antro. Lembre-se: ácido não neutraliza ácido.
Os principais sintomas são
sensação de queimadura, dor retroesternal, edema de lábios, boca e faringe,
hematêmese e sialorréia por impossibilidade de engolir saliva. Quando a lesão
corrosiva causa estenose do esôfago, os sintomas só aparecem meses depois.
Esses sintomas englobam disfagia. Se acaso houver aspiração, o paciente pode
evoluir para edema de laringe, e ainda para insuficiência respiratória.
Quando o acidente envolve pilhas,
90% não ocorrem nenhum evento lesivo. Quando esse ocorre, pode ocasionar
perfuração do esôfago, com formação de fístulas para a traqueia e para o arco
aórtico, cuja evolução é fatal. Essas lesões podem ocorrer por três mecanismos:
descarga elétrica, vazamento de produtos alcalinos altamente concentrados, e
necrose por impedimento do fluxo sanguíneo. Na maioria dos casos de lesões
pelos agentes corrosivos, o indivíduo apresenta disfagia, sialorréia,
inapetência.
As lesões corrosivas de diversas
origens têm um problema em comum, que é o depósito exacerbado de fibrose,
podendo ocorrer estenose tardia – até mesmo 50 anos depois – com potencial para
carcinogênese.
As lesões esofágicas em geral
possuem três fases, tendo variações de sintomas na primeira fase; de latência
na segunda; e instalação de estenose na terceira, esta tendo relato de casos de
ocorrência de até décadas após a ingestão do agente agressor.
REFERÊNCIAS
CORSI, P. R.; HOYOS, S. Rasslan; VIANA, A. de T.; GAGLIARD,
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COELHO, Júlio Cézar Uili. Aparelho digestivo. vol. 2. Editora Medsi. Rio de Janeiro, 1996.